Monday, January 26, 2015

Para sempre nosso, Caio F.


Ao som de Menino Deus, do Caetano Veloso

Querido Caio,



Assisti sábado o documentário “Para sempre teu, Caio F”, da Paula Dipp e do Candé Salles. Emocionante, como você era lindo menino! Teus amigos deram depoimentos sobre você, a Déa Marques, o Luiz Arthur Nunes, o Luciano Alabarse, essa gente que eu já me sinto íntima, porque li muitas das cartas que vocês trocavam. Falaram da tua obra e da tua pessoa. Lembraram fatos, contaram histórias, elogiaram os textos e se emocionaram. Seus irmãos também falaram, deve ser difícil para eles.

A Regina Duarte fez uma fala linda, disse que muita coisa ela só se deu conta depois de ler você, que pinçou coisas na consciência dela que poderiam passar a vida toda, adormecidas. É isso Caio! Você fez isso comigo também e com tanta gente por aí. Lembra que nossa relação não foi assim, de uma hora para outra. Li Sargento Garcia no colégio e foi muito forte para uma menina de 14 anos. Depois, já na faculdade uma amiga vivia falando bem de você e eu resistia, até o dia que um professor levou Os Sobreviventes como exemplo de texto pós-moderno. Me ganhou, foi um amor à segunda leitura.

Sério Caio, você tão virginiano me trouxe detalhes da vida que eu nunca teria reparado. Me falou de amores falidos e bem sucedidos, me explicou a fossa e a finitude  da vida, me mostrou o lado feio, sujo e sombrio das pessoas, me descreveu o sexo das mais diversas maneiras, me acompanhou quando mergulhei de cabeça no fundo do poço e me deu a mão quando foi necessário voltar para o lado leve do mundo. Tudo através dos teus textos tão crus, verdadeiros, sem firulas, tudo muito simples, mas igualmente intenso. Ensinou que a gente sempre pode tirar um coelho da cartola ou enfeitar até a amargura.

Teve uma vez, eu estava numa estação de trem na Áustria, era madrugada. Com meus 25 anos, fazia uma viagem de mais de dois meses pela Europa e sozinha. Aquele dia estava cansada, há dias eu não conversava com ninguém. Tinha vindo de Munique, descido numa estação de Viena no meio da tarde, almoçado ali mesmo, dado uma volta pelas ruas próximas, pegado um ônibus para essa estação que estava onde pegaria o trem lá pelas 2h48 (lembro que era um horário quebrado e ainda assim, os trens nunca se atrasavam) para Milão.

A estação ficava nos arredores de Viena, no meio do nada, eu fiquei umas quatro horas lá, sozinha, esperando o trem que veio da Rússia. Virou até história, os amigos pedem como foi mesmo a história do tal trem russo... O fato é que comecei a entrar em pânico, eu que sempre lidei bem com a minha solidão, sentia ela arranhar, porque naquele momento, num país estranho, de passagem, com um mochilão nas costas, eu era ninguém Caio, eu era só solidão. Lembrei de uma das suas cartas que você relatou algo parecido quando estava sozinho no interior da Escócia, disse que tinha vontade de se machucar para ter uma dor física que desviasse o foco da dor interna. Eu sentia isso. Ali, eu chorei metros cúbicos enquanto esperava o trem russo, que chegou pontualmente e me levou. Pior que o peso da mochila, só o peso da solidão. Mas você me acompanhava.

Teve outra vez, que eu tava triste, não me lembro o motivo, lia alguma coisa sobre As Frangas, sempre engraçado. Mas eu chorava desesperadamente e pensava que “as frangas eram a válvula de escape do Caio”, a gente tem que criar ilusões e histórias com finais felizes para aguentar essa barra pesadíssima que é a vida.

Me sinto íntima até das tuas frangas. Tenho um amigo que não gosta de você e às vezes isso é tema de discussões intermináveis. Qualquer pessoa que goste de mim, leverá você, o Fito Paez e músicas árabes de brinde. Assim como qualquer pessoa que goste de você, levará as frangas e a Ângela Rô Rô como anexo. Nós e nossas extensões...

Alguém no documentário disse que você era muito gentil, que mandava recados e bilhetinhos para os colegas de trabalho, que não poupava esforços na hora de agradar quem amava, na hora pensei “é o nosso ascendente em libra” que nos torna mais humanos. Meu fogo leonino e sua terra virginiana são espalhados pelo ar da justiça libriana.

Bah Caio, falando dos astros, o mundo anda bem virado. Assim como os seus amigos, me pergunto o que você pensaria se ainda fosse vivo (em 2016 fará 20 anos que você se foi). Ano de Marte esse 2015, já viu né, disputas, guerras, batalhas, tudo a flor da pele, muito excesso, egos em ebulição -  Júpiter está em Leão. Quando será que vamos saber canalizar positivamente a energia do Universo?

A Veja, aquela revista que você trabalhou, é hoje o pior exemplo do jornalismo brasileiro. Jornalistas continuam quando pouco e trabalhando muito. Mas escrever ainda é  libertador. E a internet que você conheceu tão superficialmente, se tornou fundamental, o que você pensaria sobre essa orgia virtual? Temos também as redes sociais, no Facebook  você é rei Caio, o que me deixa ora orgulhosa, ora irritada.

Virou até referência entre teus leitores perguntar se “é fã do Caio antes ou depois do Face?” Há inúmeras páginas sobre você, com milhares de curtidas, frases são repetidas e compartilhadas a exaustão, aquela foto com o Cazuza é ícone. Como fã, fico muito orgulhosa com todo esse teu sucesso. Mais que merecido.

Mas quando vejo uma frase que não é sua atribuída a você, me irrita. Me incomoda também que fiquem só na superficialidade do “que seja doce” – uma das frases mais compartilhadas – tem um mundo por trás disso. As pessoas tem que saber que você foi uma dos maiores escritores existencialistas do Brasil, traduzido para dezenas de países, ganhou os prêmios mais importantes da literatura nacional, foi dramaturgo e colunista de jornal.

É ótimo citarem trechos dos contos mais leves e solares como Que seja doce... ou Zero Grau em Libra, mas tem que conhecerem os outros Carta anônima, Aqueles dois, Para uma avenca partindo – só para citar alguns dos mais conhecidos. Saberem da importância de Os Sobreviventes por causa da maneira frenética que a gente lê devido ao uso que você fez da pontuação. É necessário ler os teus romances Limite Branco e Onde andará Dulce Veiga?

Se apropriarem da tua imensa contribuição para a nossa cultura pop, a criação da expressão “saia justa” , ou da classificação para os gays: Jacira, Telma, Irma e Irene. Acredita que meus amigos homossexuais usam ainda hoje, principalmente a Jacira (Jacííííra) e a Irene? Caio, você ainda é muito presente.

Guri, alguém contou em um determinado momento do documentário, acho que foi a Lygia Fagundes Telles, que você tava chapadão com a Hilda Hilst, na Casa do Sol (apareceu a Figueira, a tua Figueira mágica), e vocês saíram para conversar com os mortos. Rimos muitos no cinema. E a Lygia disse algo do tipo: “loucos, mas cúmplices”. Lembrei de uma noite que eu estava lá na Guarda do Embaú, depois de várias canecas de chá de cogumelo, eu e a Tatá vimos um disco voador no meio do Rio da Madre, ou algo muito parecido com isso, eram várias luzes coloridas, lindo e assustador de se vê. Pouco falo com a Tatá hoje em dia, nem sei se ela continua morando na Palhoça ou se voltou para São Paulo, mas às vezes rola umas mensagens no Face do tipo “e aí, tudo certo, lembra do nosso disco voador?” Acho que é só para ter certeza de que somos cúmplices caso apareça alguma dúvida em relação à loucura.

Sabe Caio, quando começaram a falar sobre a AIDS no documentário fiquei triste, sabia que era o começo do fim, do filme e da vida. Uma coisa que sempre me chamou a atenção foi o teu medo de ter essa doença, seria intuição? Ontem à tarde, estava tomando banho de sol e pensando que eu deveria enfrentar o meu medo de dirigir, facilitaria a vida quando quisesse viajar para algum lugar próximo. Mas tenho medo, sei lá, aí pensei no teu lance com a AIDS, será que o meu pavor de trânsito é intuição de alguma coisa? Que isso ainda vai me levar pessoas que amo (vou ali bater na madeira) ou até mesmo eu?  

Sobre pessoas que se ama, já fiquei com muita raiva daquele teu ex, aquele que é colunista de jornal, já pensei em bater na porta dele e tirar satisfação: “como assim você esnobou o Caio, ele sofreu horrores por ti”... Imagina a cena que uma leonina, com ascendente em libra e Vênus em câncer iria fazer? Mexe com quem amo, para ver!  Até o dia que li uma entrevista dele falando isso, que os teus fã o odeiam, que o perseguem... Claro que ele disse que não foi bem assim, que você era exagerado e uma pessoa difícil de lidar. De qualquer maneira, ele está tendo o que merece. Bem feito!

É isso Caio, muita coisa para te dizer. Se estivesse vivo, encheria a tua caixa postal e de emails. Queria te falar do documentário, que és lindo, que tem uma legião de gente que emana amor quando pensa em você. A Suzana Pires resumiu bem, disse que “só lê Caio quem viver”, a tua obra, por mais niilista, pessimista e até depressiva que seja, é sobre a vida. Para se viver bem tem que transitar por todos os lados. Tem que ter a noção da risada desesperada, doida para ser exteriorizada, no meio da tragédia e da dor, assim como saber da tristeza presente quando estamos inebriados de alegria fugaz.

Não entendo como você, tão espiritualizado, comia carne e como tão intenso, não tinha tatuagens...  Já tenho “que seja doce” tatuado no braço, penso em fazer outra frase, mas estou em dúvida. Gosto de “exigimos o eterno do perecível, loucos", “a única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso” e “chegar ao centro, sem partir-se em mil fragmentos pelo caminho”, qual você prefere?

Outro dia, joguei tarô e saiu tanta carta boa, O Mundo (esse se repetiu em todas as perguntas), O Sol, A Estrela, A Roda da Fortuna. O jogo revelou um futuro bem bonito, acho que tenho que fazer a minha parte agora, embora não saiba exatamente o que fazer... Sou meio tapada para algumas coisas.

Como você já está aí numa dimensão bem melhor que a nossa, não tem como postar essa carta no correio, embora pudesse mandar para os teus irmãos... Posto aqui no blog e sei que o Universo vai levar meu amor e vibração até aí, junto com os meus sinceros desejos que o teu paraíso seja repleto de rosas e girassóis, doces de figo, incensos e conversas com a Ana C, muita luz para ela também.

Quando eu morrer Caio, vou levar os livros para você autografar, quero te encontrar e te abraçar – imagino em qual altura do teu peito a minha cabeça vai bater (você tinha quase 1,90m, né?), espero que eu consiga escutar teu coração. Poderemos conversar sobre astrologia, I Ching, tarô, búzios, runas, lexotan, sincronismo, co-criação  e outras viagens, você me contará das suas rosas, eu vou falar do meu jasmim. Quando morar no meio do mato e ter um jardim, ele se chamará Caio F.

Eu comecei escrevendo essa carta ontem, domingo, já com a ideia de postar hoje por causa da lua que ingressa em touro (estável morada de Vênus) e porque Vênus está nos últimos graus de aquário, seguindo para peixes, um ótimo céu, mais amoroso! Agora revisando, me dei conta que esqueci de relatar que quando terminou o documentário teve gente que só saiu da sala depois que encerrou os créditos, vi duas moças saírem abraçadas e chorando, vi rapazes dando tapinhas nas costas e sorrindo cúmplices, todos saíram tocados. Eu garanto, você foi e é muito amado pelo que escreveu. O Universo te deu exatamente o que você desejava. Axé!!!

Para sempre tua, Re

Saturday, January 24, 2015

Uma velha conhecida (Trilogia da leveza – parte III)


Foi na noite do 1º dia do ano, estava na cobertura de um prédio (9º andar, se não me engano), depois de um dia feliz com pessoas que amo e banho de mar numa praia de Santa Catarina, o fim de tarde tinha rendido cores lindas no céu, tinha aquele ventinho bom de noite na praia, estava tudo bem e eu me sentia em paz. Quando me dei conta da situação e percebi que não pensava em me matar e senti vergonha por todas as vezes que isso parecia ser a única opção. E orgulho por ter chegado até aqui.


De acordo com o diagnóstico do meu terapeuta, tenho distimia obsessiva, um tipo crônico de depressão, porém menos "grave", onde os sintomas depressivos podem durar um longo período, muitas vezes, dois anos ou mais. Só no Brasil existem de cinco a 11 milhões de indivíduos com a doença, em geral essas pessoas possuem um sentimento geral de inadequação e são excessivamente críticas.


Garanto, não fácil tocar a vida com um diagnóstico desse, mas é totalmente possível ser leve e até feliz apesar dele. Desde a adolescência eu faço terapia, sempre procurei entender o porquê do vazio. Já passei por vários psicólogos, por remédios – de Lítio a Fluoxetina, terapias alternativas – florais, reiki, meditação, acumpultura... Já ouvi que tudo isso é frescura.


Atualmente sigo só com a terapia psiquiátrica e nunca lidei tão bem com tudo isso, acho que é a experiência. Distimia, depressão, bipolaridade, borderline são doenças como diabetes, asma, tuberculose e precisam ser tratadas. Não tem nada de frescura nisso!


Hoje por exemplo, estou meio triste, mas é só tristeza - não estou subestimando esse sentimento, sei muito bem o estrago que faz - mas sei que neste momento é só isso, tristeza, pois algo que queria parece que não vai rolar. Coisas da vida... Não me sinto vazia, quando eu me encho de vazio, o sinal vermelho acende. Sei que isso pode e provavelmente irá acontecer em outros momentos da minha vida. Terei outras crises, mas penso que por ser reincidente, já coloquei uma cama elástica lá no final do meu abismo e por mais cheia de falta de sentido que eu volte a ficar, se a queda não for amortecida, ao menos não terá aquele desconforto de primeira vez. Conhecimento trás segurança e intimidade até com coisas não tão boas.


Esses anos todos em volta disso ampliaram muito minha consciência. Não me orgulho de escrever que houve momentos que eu não chegaria nem perto de uma sacada com medo de não resistir e me jogar e acabar com tudo, mas também não me envergonho. Tenho consciência disso e que tenho que lidar com os meus demônios. Mas tenho certeza de que esse assunto tem que deixar de ser tabu!


Por sorte ou mecanismos inconscientes de defesas, sempre tive coisas para me agarrar, para justificar minha permanência aqui. É questão de honra para mim me preencher o meu vazio com coisas que gosto, posso me sentir vazia mas oca, não sou. Rousseau diz que a “felicidade é um estado simples e permanente em que a alma basta a si mesmo.” Bingo!


Quando comecei a Trilogia da Leveza falando sobre autoconhecimento é porque isso foi fundamental para a Renata entender a Renata. Se me sinto leve, se penso que minha alma me basta foi porque um dia nada me bastava. 2015 começou muito bem, com energias boas, calmaria, família, perfume e risada de bebê, esperança, sossego, diria até que foi um começo bem feliz, melhor despedida para o Saturno não poderia ter. Fiz a lição de casa me sinto grata por isso. Ainda dá tempo de ter desejos de ano novo? Desejo cada vez mais ouvir a minha alma e não o meu ego.


Friday, January 16, 2015

A arte de ser leve (Trilogia da leveza – parte II)


"Meu reino terrestre por um par de asas" - Roseana Murray



Uma querida amiga me deu no natal o livro “A arte de ser leve”, da jornalista Leila Ferreira. Lançado em 2010, a obra reúne histórias e impressões da autora sobre o conceito de leveza, que vão sendo aos poucos tiradas do cotidiano, da memória, das entrevistas acumuladas em sua carreira com pessoas importantes e dos bate-papos com anônimos. Mas também apresenta dados oficiais e interessantes obtidos em pesquisas recentes da psicologia, da sociologia e da medicina.

Claro que achei o máximo ganhar esse livro neste momento da minha vida e foi a primeira leitura do ano. A autora viajou o mundo para conversar com as pessoas sobre o assunto, aliás, as viagens são apontadas como fator de leveza. Assim como o silêncio, ter tempo para si, cultivar hobbies saudáveis, vínculos com pessoas que nos são caras e tantas outras coisas que já sabemos, lemos por aí, assistimos em qualquer matéria sobre bem estar e qualidade de vida.

Porém, não percebi no "A arte de ser leve" aquela pretensão dos livros de autoajuda, como se fosse um manual de instruções que ensinasse a viver. Bem pelo contrário, a escritora sempre ressalta como é difícil a busca pela tal leveza e afirma que está muito longe disso. Mas o melhor de tudo, é que fica claro que viver de forma mais leve é uma escolha e exige disciplina e força de vontade.

Compartilho com a Leila, a ideia de que a leveza não é felicidade, mas é um degrau bem próximo e que talvez, um ser humano leve é mais completo que um ser humano que se considera feliz. Num dos capítulos, há uma entrevista com o filósofo Janine Ribeiro, que alerta para a confusão entre prazer e felicidade, pois o prazer é se dá nos instantes (nascem e se esgotam ali), e buscamos em especial os prazeres que tem na paixão.

O filósofo define paixão como um estado de engano, causado muitas vezes pela euforia, que nos torna passivos diante da vida. Reproduzo a conclusão dele: "a felicidade é mais modesta. Faz parte dela o aprendizado, a renúncia, a capacidade de converter a decepção em algo positivo. Em outras palavras, só é feliz quem souber reciclar suas tristezas. Frustrações são importante matéria prima para a felicidade”. Mais do que nunca, penso que o caminho do meio é a leveza.

Conforme avançava nas páginas, me dava conta de que é possível ter esperança na raça humana com tanta gente leve e de bem por aí. E me chamava atenção o fato da escritora não ter falado em depressão, até que ela tocou no assunto, nos últimos capítulos quando relata o motivo que a levou a escrever o livro.

Leila conta que tem depressão há mais de 20 anos, que já se considerada casada com a fluoxetina e acredita que ainda assim pode ser leve. Mais um ponto para ela, não é fácil assumir que tem depressão, bipolaridade ou distimia, e conseguir escrever com a devida distância sobre um assunto teoricamente oposto, sem ser influenciada pela doença que tem. Mas depressão é assunto para o outro texto...

Por enquanto, só a ideia (sem certezas) de que leveza já está de bom tamanho.

Friday, January 09, 2015

Encontro com Saturno (Trilogia da leveza – parte I)


“Até onde podemos discernir, o único propósito da existência humana 
é acender uma luz na escuridão do mero ser” - Carl Jung

Em 2015 completo 30 anos e no primeiro trimestre, encerra o meu retorno de Saturno (período da vida - por volta dos 28, 29 anos-  que o planeta Saturno volta para a posição exata que está no mapa natal). No meu caso, na casa 1 - a casa do "eu", da identidade, da personalidade. Saturno permanece mais de dois anos em cada casa astral, por isso, leva quase 30 anos para completar o ciclo.

Por essa época, é normal mudanças e reviravoltas na vida. É Saturno nos cobrando o que temos feito até agora, é a colheita justa do que plantamos. Conheço pessoas que mudaram de emprego, casaram, engravidaram, viram relacionamentos longos chegar ao fim, a carreira tomar outros rumos, tudo nestes 28 e 29 anos.

Por gostar e ler muito sobre astrologia, não considero o famoso retorno de Saturno ruim, como muitos acreditam. É uma chance de conscientização, pois se há rupturas e desconstruções, é justamente para deixar conosco apenas o que vale a pena. Saturno não brinca em serviço, não permite empurrarmos a vida com a barriga.

A palavra que melhor define este trânsito astral para mim é amadurecimento, não só pelos fatores externos, mas porque entendi a necessidade que eu tenho de olhar para mim. Acredito, hoje, que o meu caminho sempre será melhor trilhado pelo autoconhecimento. É o conhecimento sobre si que possibilita que o indivíduo lide melhor com a transitoriedade das situações. Pode não ser fácil, mas é atráves desse autoconhecimento que buscamos meios de sanar os “estragos” e recomeçar tudo de novo de maneira mais madura e por isso, diferente.

No segundo semestre de 2013, a minha colega saiu do serviço, o que me fez tocar toda a assessoria de comunicação sozinha (se as coisas já eram puxadas para duas jornalistas...), tive uma Trombose Venosa na perna (o que me obrigou a parar, literalmente) e logo no começo de 2014, levei um pé na bunda homérico enquanto olhava os classificados em busca do apartamento para morarmos juntos.

Eu andava alucinada, com mil coisas para fazer, me cobrando, trabalhando até tarde, começava coisas e não terminava, irritada e sempre no piloto automático. Tinhas dias que a correria era tanta que quando entrava no metro e era obrigada a permanecer 40 minutos sem fazer nada, sentia tipo de um "choque", com o coração a mil, o sangue correndo, o corpo todo agitado e a cabeça entrando em parafuso. Todas as coisas que aconteceram, me obrigaram a rever o rumo que estava tomando.

Porém, mudar meu ritmo não era uma opção. Ter coisas para fazer, dois empregos e hobbies nunca foram um problema, me dão prazer. Porém chegou num ponto que eu não aguentava mais, não pela quantidade de coisas mas pela qualidade da minha dedicação, que estava precária. Não me focava mais, não vivia o presente. Trabalhava pensando no pilates, fazia pilates repassando na cabeça todo o serviço que tinha levado para casa, ficava até de madrugada fazendo coisas do serviço pensando na correria que seria o dia seguinte, tudo isso planejando a mudança e a vida em outra cidade.

Então a única escolha era mudar a maneira que lido com as coisas. É difícil, muito difícil, estou só no começo... Mas me percebo menos ansiosa, não levo mais trabalho para casa quase todos os dias (só quando não tem jeito mesmo), me cobro menos, passei a me dedicar com mais intensidade as coisas que gosto e voltei a sentir. Retomei com seriedade os estudos na Casa Espírita, estou levando muito a sério a minha terapia (coisa que já havia se tornado burocrática). Não empurro mais a vida com a barriga.

Se é para fazer, quero sentir tudo o que eu tenho direito. Se estou caminhando, foco nisso; no trabalho é a mesma coisa; pilates e dança, idem e os happies com as amigas, nem se fala. Quem olha de fora, não nota diferença, as coisas ao meu redor podem estar caóticas, mas foi uma baita mudança interna que me possibilitou aproveitar mais as coisas. Preciso ter (ou ao menos, tentar ter) consciência de tudo, porque é isso que dá sentido para a vida.


Essa busca por mim foi Saturno (justamente na Casa 1), me cobrando, me mostrando o que necessita ser olhado com mais carinho. Estava trilhando um caminho, que achava ser o melhor, Saturno foi lá, me arrancou, colocou nos eixos e me trouxe para o caminho certo. Como disse o querido Caio F. numa carta à Hilda Hilst: “mudei muito, e não preciso que acreditem na minha mudança para que eu tenha mudado. Essa modificação vinha se processando sem que eu mesmo percebesse e, com determinadas leituras e determinadas vivências, ela se consumou.”

Trilogia da leveza


Hoje é dia 9 de janeiro e passei a semana trabalhando num texto sobre o retorno de Saturno. Na segunda fiz um cronograma de assuntos que tenho que escrever para o blog – naquela lógica de levar o Mosaico e as minhas vontades mais a sério, de mostrar o que escrevo (e não são notícias), sem ter medo das críticas.

Durante a semana, enquanto escrevia o texto sobre Saturno, me policiei para não falar de depressão e hoje, terminei a leitura de um livro que aborda a importância da leveza na nossa vida. Pensei que precisava escrever sobre isso também e que no fundo os três assuntos se complementam. Colocar tudo num texto só, ficaria imenso, intenso e tenso demais.

Então, serão três textos para compor a trilogia da leveza: sobre o retorno de Saturno, leveza e depressão – que publicarei a partir de hoje e espero encerrar em uma semana. Ficam na lista de espera os assuntos que estão no meu roteiro, um texto sobre o San (o filho dos meus primos queridos, que é o bebê mais lindo e amado que eu já conheci) e sobre um encontro com uma amiga que mora há dois anos na Austrália.

Isso, por enquanto, pois como a vida é dinâmica tem tudo que ela ainda vai me mandar.


Feliz 2015