Thursday, January 19, 2012

A era do "faz parte"

Nunca curti muito escrever sobre política ou assuntos que estão em discussão no momento aqui no Mosaico. Primeiro, porque escrever sobre política ou assuntos do momento é o meu trabalho, faço isso todos os dias. Segundo, as posições que defendo, exponho quando necessário nas reuniões, plenárias, fóruns e eventos de comunicação que participo. Terceiro, meu compromisso no blog é com os meus devaneios, só.

Mas dessa vez, não da pra fugir. Sim, o assunto já tá enchendo o saco. Sim, é sobre o tal estupro do Big Brother, ou melhor, sobre tudo que isso gerou. Chegamos no fundo do poço do grotesco. O que aconteceu na casa mais vigiada do Brasil, a mistura de alguém passando dos limites e alguém que não mediu as conseqüências, infelizmente, pode ser visto em qualquer festa. O que entristece, mesmo, é a postura da Rede Globo.

Acabei de chegar de uma pizzaria, estávamos num grupo de 20 pessoas, todas adultas, comemorando o aniversário de uma amiga. Claro que falamos sobre isso e lamentavelmente, a discussão ficou em torno do “foi sexo, não foi”, “ela estava acordada e gostando”, “ela queria”... E isso me irrita, muito pior do que aconteceu é a Rede Globo, a maior grupo de comunicação do Brasil, teoricamente comandada por pessoas capazes de pensar e raciocinar, deixar isso ter acontecido. É um desrespeito com os participantes do programa, com os funcionários que cumprem ordens e com os telespectadores.

Onde estavam os produtores que acompanham os confinados 24 horas? Se alguém passa mal, se um resolver se matar, se outro beber demais e se afogar na piscina, eles vão intervir. E nessa situação, por que não intervieram? Talvez acender as luzes tivesse evitado... Mas acho que a produção e o tal do Boni vibravam com as possíveis manchetes do dia seguinte: “primeira festa do BBB acaba em sexo”, “Sexo na Casa”, “Recorde do BBB, sexo na primeira festa”...

Só que hoje tem Twitter, onde todo mundo expõe seus achismos e teve alguém que achou que a moça estava dormindo. Muitos acharam a mesma coisa... Tenho certeza que muita gente ficou sabendo da história pelo Twitter, como eu, e domingo a noite se prestou a assistir o programa e aí começou o “apogeu da chinelagem” como definiu o Juremir Machado. Para o Bial, o amor é lindo e o show tem que continuar!

Depois de muito auê nas redes sociais e, aposto como isso influenciou muito, o rapaz saiu do programa, sem maiores explicações. Até tentaram, mas se tem algo que a Globo não sabe fazer é se explicar. E vai ficar por isso mesmo... Os outros BBBs já criaram o Bambam, a gorda, a lésbica, o gay, a vovó... E se a situação não for esclarecida, essa edição criou o estrupador e a estrupada.

E a cabeça dessas criaturas, como fica? Penso que os dois foram vítimas de uma situação montada (festa e bebida liberada), de uma edição manipulada e de uma orientação, da direção, despreparada. E o público? O grande público que tem como único meio de informação e entretenimento, a televisão. Eles não tem acesso a internet e inúmeros artigos com os mais diversos pontos de vista, o que é bom, propicia uma reflexão... Esses brasileiros não merecem uma explicação da Rede Globo? Sério, tem gente que não sabe o motivo de um dos participantes simplesmente sumiu!

Absurdo? Sim, tão absurdo como o Brasil ser o único país do mundo a chegar a 12ª edição dessa bosta. Tão absurdo quanto incentivar o consumo de álcool se todos os dias, os meios de comunicação fazem campanha contra. Tão absurdo quanto sair em sites da Globo que a moça abusada “usava roupas insinuantes” quando são os produtores que determinam a roupa dos participantes nas festas...

Reality show já foi inovador, agora é lugar comum. Acredito que infelizmente essa postura é o reflexo da sociedade brasileira. Niilista, omissa, moralistas, machista, o país do jeitinho, do tanto faz, do deixa disso, do qualquer coisa serve, do faz parte... A gente aceita, fazer o que né?

Agora, a política ou o devaneio: é fundamental uma legislação para os meios de comunicação no Brasil, que inclua dos meios de produção aos produtos e a forma de distribuição. Isso não é censura, é uma maneira de qualificar a mídia brasileira e evitar que esses constrangimentos sociais aconteçam.

Quando não sabemos lidar com a liberdade, as coisas tem que ser centralizadas e determinadas sim! Quando se é educado a pensar que liberdade é “pode tudo”, não demora muito para isso virar libertinagem (querem exemplo melhor que o suposto estrupo no BBB?)

Há várias ações rolando na internet e posições dos movimentos sociais para que o Big Brother saia do ar, lamentável isso não chegar ao grande público. O Ministério das Comunicações tem o poder de tirar o programa do ar e de proibir uma futura edição (o que penso não terá coragem de fazer), mas gostaria muito que isso acontece. Ao menos o debate no próximo verão, seria mais qualificado.

Até lá a gente vai engolindo essa edição. Agora, se na primeira semana já alcançamos esse nível de baixeza, imaginem o que vem por aí, nos três meses de programa que restam. Seja lá o que for, faz parte.

Wednesday, January 11, 2012

Mano







Há 24 anos, eu ganhava um irmão e lembro exatamente do dia que meus pais chegaram do hospital com ele. Assim como recordo perfeitamente uma noite que faltou luz e ele acordou desesperado, gritando que estava cego. Da mesma maneira, que nunca vou me esquecer dele segurando três bolsas, duas mochilas e um balão, debaixo de chuva no meio do Beto Carreiro.

Meu irmão com todas as suas tatuagens e piercings ainda conserva uma ingenuidade rara nos dias de hoje, quase infantil. Ele não gosta de nada que lhe tire do caminho, da rota, da rotina, do planejado. É maniático com organização e hipocondríaco. Sempre quis casar e ter filhos, sempre namorou sério. É uma pessoa bem diferente de mim.

E sempre foi assim, às vezes vem, me pergunta alguma coisa, coça o cavanhaque, diz “é mesmo, mana?” e sai pensativo. Posso falar a coisa mais séria do mundo ou a maior bobagem, que a cena se repete. Apesar disso, meu irmão mudou muito no último ano, aprendeu a ler, mais que isso, aprendeu a gostar de ler.

Estudar nunca foi o forte dele, nunca pensou em faculdade, mas fez uns cursos do SENAI, conseguiu um bom emprego, está lá até hoje e se a vida segue mansa, pra ele está bom. Eu estava viajando quando a mudança ocorreu. Sei que começou lendo a Bíblia, um dia recebi um email da mãe falando “teu irmão está fazendo a festa com teus livros”.

Quando voltei, me deparei com um leitor voraz e lê coisa boa o menino: Marx, Voltaire, Rousseau, Durkheim, Nietzsche, Boaventura, Gramsci... Ah, é muito bom ver alguém se desalienando, além de ter uma pessoa dentro de casa para conversar sobre isso.

Às vezes ele vem, entra no meu quarto, pergunta se tenho algum polígrafo da pós sobre determinado assunto, lê, a gente conversa e ele diz “é mesmo, mana?” e sai pensativo, do mesmo jeito que fez a vida toda e que eu espero, faça até um de nos morrer.

“É mesmo, mana?” é a bússola de todo irmão mais velho. É o que dá sentido, é a minha chance de responder. Eu posso nunca ter para quem perguntar, mas sempre vou ter quem vai procurar as minhas respostas.

Quando a mãe chegou com o mano do hospital, eu sai correndo e ali naquele instante, ele saiu correndo atrás de mim.

Tuesday, January 03, 2012

2012

Então ano novo, qual é a tua? Já passaram três dias e estou te achando com cara de tudo igual. Aliás, me segurei para não escrever no dia 1º, corria o risco de fazer listinhas bobas com desejos e promessas que não se sustentam nem até o quinto dia útil.

Mas, teremos que conviver até que tu acabe em um ritual com fogos de artifícios, programas especiais na televisão e simpatias para atrair amor, dinheiro, emprego... Por quê? Por que essa necessidade do ser humano de ritos de passagem, de demarcar o tempo como se fosse algo concreto?

É por causa da nossa incapacidade de lidar com a infinitude do tempo e com a finitude das coisas, das pessoas, da vida, que você existe ano novo. É porque eu gosto de escrever e uma tela em branco é como um palco que se pode tudo, que estou conversando com você. Como se em algum lugar o jovem ano novo me lesse e o grande senhor tempo, também. E, quem sabe um dia, me mandem as respostas.

Talvez seja importante pensarmos em blocos de 12 meses, ao menos é um período razoável para tentar alguma coisa. Se der certo, o ano foi uma maravilha. Se der errado, ano que vem tudo será diferente e melhor. Simples, assim. O tempo, macaco velho em artimanhas e armadilhas, deve se divertir um bocado com as nossas esperanças, desejos e promessas renovadas a cada final de dezembro.

De todas as coisas que ouvi na noite do dia 31, a mais original foi de uma tia, que me disse: “por favor, não entra em parafuso esse ano”. Fiquei pensando nisso, é um desejo bem diferente, duvido que ano que vem ela vá me falar a mesma coisa.

Então 2012, olhe e ajuste com cuidado os meus parafusos, mas se caso for necessário para minha evolução dar uma surtada, pode se distrair um pouco. Afinal, eu vou me virar né? Nem eu, nem você pensamos que chegaríamos até aqui.