Thursday, December 24, 2015

Balancete anual

O ano está acabando e eu não consegui tirar todo pó do blog (meu velho e bom mimimi). Não consegui escrever sobre a viagem a Bariloche com o meu afilhado, nem sobre o lançamento do livro da oficina, mês passado - esses dois textos foram começados  e se encontram devidamente parados - talvez por complexo de jornalista que pensa que as coisas ficam velhas rápidas demais. E nem sequer comecei um texto para o A. ou para o que ele faz eu sentir.

Por pouco, não consegui me apresentar na dança esse ano, por falta de tempo. E embora isso não seja prioridade na minha vida e mesmo sendo a pessoa mais sem ritmo do mundo, a dança do ventre é umas das coisas que mais me fazem bem. E essa falta de tempo se deu ao fato de ter sido um ano de trabalho intenso.

As melhores coisas foram as viagens (assim que terminar o texto, vou arrumar as malas para Mendoza) e a oficina literária. A alegria do meu irmão na sessão de autógrafos foi algo q eu não esperava e me deixou muito feliz.

Mas nada foi mais surpreendente do que essa história louca com o A., alguém que já conheço há anos, e de repente se “adona” assim do meu coração. E com 30 anos estou descobrindo o que é viver um relacionamento saudável.


Só quero seguir assim e escrever mais em 2016, claro q isso só depende de mim. E quem sabe terminar os textos iniciados, já que emoção não fica velha nunca.

Sunday, November 01, 2015

Sobre sonhos realizados


Este é o convite para o lançamento do livro "Nos caminhos da imprensa Rio-Grandense e Brasileira", do qual eu sou co-autora.

Pensem em feliz!


Saturday, October 03, 2015

Muito prazer

Sempre gostei de histórias e sempre fui silenciosa. Minha relação com a palavra é intensa. Das lembranças da infância, as sessões com fonoaudiólogos que me acompanharam por anos, são bastante nítidas. As palavras me assustavam. Falar era difícil, complicado e trabalhoso. Um dos piores exercícios era ler algo em voz alta. Porém, desde quando aprendi a escrever perdi o medo. Colocadas no papel, as palavras me libertavam.


Essa foi minha primeira oficina literária, depois de várias indicações de amigos que já haviam  passado pela experiência. Encontrei colegas, conheci muita gente bacana e ainda não sei dimensionar tudo o que aprendi. Já no primeiro dia de aula, percebi que seria um grande desafio escrever com tantos colegas escritores bons. Não sabia que em toda aula teria que ler em voz alta os meus contos. Ainda bem que a palavra que assusta, também liberta.


***Apresentação feita para o livro "Nos caminhos da imprensa Rio-Grandense e Brasileira", do qual sou coautora. A obra é fruto da oficina de criação literária Alcy Cheuiche.

Tuesday, September 29, 2015

Traçando histórias

Sem jeito, o jovem com uma pasta entra na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Encara a secretária e pede para falar com o seu Henrique, é o estudante que precisa entrevistá-lo, indicação do Luiz Inácio. A moça sorri da formalidade forçada e fala alto, quase gritando: Henfil, o Caio chegou.

Logo um moreno, barbudo, de sandálias, calça jeans e camiseta vermelha lhe estende a mão. Vamos conversar no bar da esquina, o sindicato fecha daqui a pouco. Ah, pode me chamar de Henfil, diz ao jovem. Já sentados numa mesa na calçada, Caio começa a entrevista, explica que é para um trabalho da faculdade sobre o chamado novo sindicalismo.

Henfil explica o trabalho da Oboré, uma cooperativa de profissionais da comunicação que prestam serviços para sindicatos. É uma tentativa de ser um contraponto aos grandes meios de comunicação que não dialogam com os trabalhadores e por outro lado, de fazerem materiais sindicais mais atrativos, que cativem a base.

Somos a retaguarda dos movimentos sociais. Temos que ir lá, meter a mão, ajudar naquilo que pudermos, mas sempre na retaguarda. Nós não somos a vanguarda; os trabalhadores é que são, disse ao estudante.

Caio soube também que Henfil e Luiz Inácio ainda não conhecem pessoalmente, mas ele sabe que Lula o acompanha desde o Pasquim, que o pessoal da Oboré estão trabalhando numa cartilha para o 3º Congresso dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas de São Bernardo e Diadema. A expectativa de todos é que a atividade seja um marco para o movimento sindical.

Durante as três horas de conversa e muitas garrafas de cervejas, ficou claro para o estudante que Henfil era um idealista, um Dom Quixote armado de lápis, papel e senso de humor. Quem não entendeu muito foi o cartunista. Por que justo ele foi o indicado para aquela entrevista meio sem pé nem cabeça, sobre o movimento sindical, mas que falaram mais sobre os cartuns do que qualquer outra coisa.


Caio é estudante de Ciências Sociais e nas horas vagas desenha, sonha em viver de sua arte. Vai embora meio bêbado e orgulhoso da conversa com um dos maiores cartunistas do Brasil. Na pasta leva os próprios desenhos, não teve coragem de mostrar para o Henfil, mas tem certeza do futuro que vai traçar.

Sunday, August 30, 2015

Vítimas da guerra*

O professor caminha devagar pelos corredores da escola, tem os cabelos brancos e a aparência de quem envelheceu antes da hora. As costas parecem mais curvadas que o normal, não pelo peso dos livros, mas por causa da tristeza e da impotência diante da inversão supostamente natural da vida.

Alheio a tudo, procurando achar um sentido para o futuro que resta, o professor reluta em entrar na sala de aula. Nunca isso foi tão difícil, é o seu ofício diário há 30 anos, mas não conseguiu identificar um momento tão árduo assim. O primeiro dia na sala de aula, quando estava de ressaca, voltava de uma greve sem resultados, a época do mestrado ou quando sua mulher estava prestes a ir para a maternidade... Foram tranquilos perto desta manhã.

Formado em história, o professor era apaixonado pela cultura gaúcha e especializado na guerra dos Farrapos. Natural de Porto Alegre, desde que passou num concurso público, morava em Viamão, feliz coincidência já que a cidade fora um local fundamental para a história Farroupilha. Caçador de personagens esquecidos, havia dado o nome de Luiz ao seu filho por causa de Luigi Rossetti, italiano, amigo de Garibaldi, criador do O Povo, morto em Viamão num 24 de novembro – dia do nascimento do seu menino - na época que o município se chamava Setembrina.

O professor entra na sala do quinto ano cabisbaixo. O silêncio dos alunos tem o peso de sua dor, podia ouvir o que estavam falando, minutos antes. Os pré-adolescentes inquietos comentavam, falavam alto, será que o sor vem, alguns se perguntavam. Todos viram, todos sabiam, muitos compartilharam. Saiu até matéria na página policial do Diário de Viamão, guerra do tráfico faz mais uma vítima, dizia a manchete. Era de conhecimento de todos que o Luiz da Silva, 23 anos, morto no bairro Valença, com duas facadas quando ainda estava em cima da moto, era o filho do professor de história.


Ele encara os alunos, por um segundo pensa que a maioria está mais próxima de ser vítima da guerra do tráfico do que herói em qualquer outra batalha, a tristeza se conforma com as fatalidades da vida. Faz a chamada, pega o plano de aula, vê que a professora substituta já começou a falar sobre a guerra dos Farrapos e suspira. Hoje vamos falar sobre Luigi Rossetti, um dos personagens mais importantes da nossa história...   

*Escrito para  a Oficina de criação literária Alcy Cheiuche

Saturday, August 08, 2015

3.0


Hoje completo 30 voltas em torno do Sol, a bordo desta grande espaçonave chamada Planeta Terra. É o primeiro ano, em muitos, que quero comemorar (o que mais fiz nos últimos meses foi celebrar). Quando era criança tinha festas homéricas e não entendia muito aquela comemoração toda.

Há 30 anos, concluía a primeira etapa e me jogava nesta aventura chamada vida na tridimensionalidade. Dizem que para fazer essa escolha é necessário amor, em todos os sentidos, é que a nossa jornada só tem sentido se essa busca for permanente.

Eu apanhei muito da vida até compreender o óbvio. Foram 29 anos carregando traços do que ainda no útero entendi como abandono e rejeição que vinha de um silêncio inexplicável. Para muitos, o oposto da vida é a morte, para mim naquele momento pré nascimento era o silêncio.


Foi necessário matar muita coisa em mim para renascer, de fato, viva. Há 30 anos eu escolhi o amor ao invés do medo. E, hoje, no dia do meu aniversário, renovo este compromisso. Porque apenas ele é real. Apenas ele nos faz seguir em frente.

E sim, vai ter comemoração mesmo!


Wednesday, July 15, 2015

Operária*

Clarice fuma um cigarro atrás do outro. Vai até a janela e procura o mar entre as paredes dos prédios. Recém separada neste final da década de 1950, mora com os dois filhos num apartamento no Leme, Rio de Janeiro. Na Europa, havia enfrentado a solidão. Aqui no Brasil, uma das batalhas é contra o calor.

Busca inspiração para mais uma coluna do "Correio feminino - Feira de Utilidades", que tem no jornal carioca Correio da Manhã. Ainda bem quem pode usar o pseudônimo de Helen Palmer, acha vergonhoso escrever dicas sobre como arrumar a casa, o cabelo, o guarda-roupas...

Pega as folhas de dentro do envelope que chegou dias antes de Belo Horizonte. Observa as cópias de algumas páginas do jornal semanal, O Sexo Feminino, fundado em 1873 pela professora Francisca Senhorinha da Motta Diniz, na pequena cidade de Campanha, no sul de Minas Gerais.

Se conseguisse abordar algum tema mais político na coluna, pensa Clarice. Quem sabe falar da existência dessa publicação, que manifestava ideais feministas. Ela lê numa das páginas “queremos a nossa emancipação – a regeneração dos costumes;  queremos a instrução para conhecermos nossos direitos, e deles usarmos em ocasião oportuna;  queremos conhecer os negócios de nosso casal para bem administrá-los quando a isso formos obrigadas; queremos enfim saber o que fazemos, o porquê, o pelo quê das coisas; queremos ser companheiras de nossos maridos, e não escravas;  queremos saber o como se fazem os negócios fora de casa;  só o que não queremos é continuar a viver enganadas”.

Clarice senta e pega a máquina. Gosta de escrever assim, no sofá com a máquina sob as pernas. Suspira, lê outro texto d’O Sexo Feminino, sobre amor maternal. Considera dar dicas de como educar os filhos, mas desiste, pois ela não tem as respostas. Está mais inquieta que o normal, pensa no seu próximo livro e na demora do retorno da editora. A batalha também é contra a falta de dinheiro.

Começa a escrever sobre a importância de manter a casa arrumada, para evitar a invasão de insetos. Não há nada mais nojento do que se deparar com uma barata esmagada no próprio quarto. Ela para, lê as poucas linhas e não acha bom. Arranca a folha da máquina e deixa de lado.

Fuma mais um cigarro e lamenta como é ruim não falar sobre as angústias, suas e de todos.   Clarice não sabe, mas o texto descartado é o embrião do seu futuro livro A Paixão Segundo G.H. que só será publicado em 1964.


Agora o mais importante é entregar a coluna. Observa suas mãos e resolve escrever sobre a importância da cor do esmalte. Acha o tom, é isso que Helen Palmer quer dizer. Enquanto ela, trava sua batalha silenciosa contra a solidão. 

* Conto produzido para a Oficina de criação literária Alcy Cheiuche.

Tuesday, June 30, 2015

Especial: edição mensal



Um único texto compacto (nem tanto como gostaria). Tem lado A e lado B, além dos extras.

Lado A

Esse mês foi incrível, cheio de sensações e consciência dos momentos preciosos. Começou muito feliz no feriadão com gente querida, negrinhos e balões na festa de um aninho do San, filho do Júnior e da Andiara. Estar com eles sempre é bom, agora com o Santiago é melhor ainda, dá para acreditar que um dia o mundo vai ser melhor.

Mas antes da festa teve momentos de muita tensão e superação. Na sexta-feira de manhã, fiquei sozinha com o San. Um bilhete tinha as instruções de como fazer a mamadeira e se possível trocar a fralda, que só teria xixi.  A batalha já começou com a dificuldade para abrir a mamadeira, que coisa dura! O tempo passava e eu pensando no que ia dizer quando a minha prima chegasse: ele tá faminto porque não achei o botão que abria a mamadeira... Seria vergonhoso.

Até que deu certo. Coloquei o lindo deitado e dei a mamadeira para ele, que toma sozinho (não tenho parâmetro para comparar, então acho muito adulto ele tomar o próprio mama com tanta autonomia). Como o San é muito esperto e depois da batalha com a mamadeira, se deu conta que ele era o ser dominante da situação e resolveu tirar proveito.

Fui lavar louça sempre conversando com ele que tossia, eu saia correndo e quando chegava perto, ele sorria o sorriso mais safado e continuava mamando, fez isso diversas vezes. Sim, um bebê de um ano tirou sarro da minha cara. Fase 1 superada e eu me achando, se até aquele momento tudo tinha dado certo, ele não havia chorado, só me restava trocar a fralda, só iria ter xixi mesmo.

Seguia conversando, explicando que a situação podia ser normal para ele, mas para mim era tudo novidade, então que pegasse leve com a adulta aqui. Peguei uma fralda nova e não achei nem uma indicação do lado que fica na frente... Inteligente que sou, me dei conta que era só olhar na que iria tirar. Abri a fralda. NÃO tinha só xixi!

Era pegadinha dos meus primos, só podia. Claro que eles sabiam que não teria só xixi. Eles deveriam estar filmando tudo só para rir da minha cara para o resto da vida. Vingança do meu primo por eu sempre lembrar o que ele fez no sofá da minha casa com 12 anos. E ainda usaram o filho como comparsa.

Pensei em fechar a fralda e deixar assim. Mas falar o que para minha prima: não tive coragem ou era tanta merda que me assustei? Seria mais vergonhoso que não conseguir abrir a mamadeira. E o San estava lá, lindo, brincando com a fralda limpa, balançando os braços, tentando conversar... Ele não merecia ficar cagado, apesar de estar tirando com a minha cara pela segunda vez.

Troquei a fralda. Acho que dei prejuízo para o meu primo, pois quase acabei com os lenços umedecidos. Minhas unhas até que não atrapalharam. O San estava lindo e limpo, era só colocar a fralda limpa, claro que devido a tensão do momento não vi o lado que fica na frente. Foi no instinto, mas pensei que tivesse errado porque eu fechava de um lado, o San abria do outro. Examinei de todas as maneiras possíveis e não achei outro jeito de fechar... Era só ele, tirando sarro de mim pela terceira vez. Fase 2 concluída com  sucesso.

Depois, o San se distraiu um pouco com um programa de TV (esses de dona de casa que passam pela manhã) onde tinha um pessoal dançando. Ele foi dançar também e caiu sentado, choramingou. Tive a brilhante ideia de dançar, ele parou e começou a sorrir. Mas eu parava de dançar, ele ameaçava a chorar, até que numa das vezes ele se entregou e riu. Era mais uma tirada de sarro da minha cara, já perdi a conta de quantas foram. Medo do que esse guri vai fazer comigo no futuro.

Em seguida, a Andiara chegou. Todos se alegraram, principalmente eu. Sobrevivemos! Deu medinho sim, mas fiquei feliz pela confiança, acho que ninguém da família deixaria os seus filhos comigo, além deles. Se eu nunca ser mãe, ao menos troquei fralda uma vez na vida.

Fiquei nervosa também para fotografar o aniversário. Meu primo além de fotógrafo é virginiano, deve me criticar bastante mentalmente, já que é muito educado e não fala para mim. Ele me explica tudo direitinho, eu faço cara de quem entendeu e seja o que Deus quiser. Torci muito para os confetes caírem em câmera lenta e garantir mais alguma foto. No final, eu achei confete até dentro do sutiã.  

Óbvio que aproveitei muito o feriado. Adoro estar com eles, sempre rimos muito, até das desgraças. E ainda vamos rir muito desses dias. Voltei leve para casa, apesar da orgia gastronômica.

Na outra segunda, uma semana depois,  teve o show do Backstreet Boys. Fiquei uma pilha, super ansiosa, nem consegui trabalhar. Mandei mensagem para o meu chefe explicando que meu namorado imaginário estava em Porto Alegre e eu tinha que aproveitar. Ele respondeu: ok, nem sabia que tinha namorado. Não perdi tempo explicando.

Não imaginava que ficaria tão mexida assim. O amigo Alexandre foi comigo, começamos a beber na fila imensa, estava muito frio. Mulheres em torno dos 30 anos era o que mais tinha, a maioria com faixas na cabeça, camiseta, cartazes, todas falando no Nick, AJ, Howie, Kevin e Brian como se fossem velhos conhecidos. E eram. Eu usei a mesma faixa do show de 2001, já desbotada, é verdade, mas ainda se lê Nick.

O show foi perfeito, todo mundo cantando e dançando com anos atrás. Foi uma apresentação bem mais simples do que a de 2001, em São Paulo, quando eles estavam no auge. Nunca mais havia escutado as músicas deles, mas cantei todas, as letras estavam arquivadas num lugar muito especial, da memória e do coração.

E que sorte a minha realizar um sonho pela segunda vez. Impossível não comparar a vida da adolescente que fui e da adulta que me tornei. As pessoas que faziam parte do meu convívio, os sonhos, as mudanças... Falávamos disso enquanto eu o Xande voltávamos para casa e para a vida real...

Lado B

A maldita falta de tempo para escrever os textos acima é tão normal que eu nem lamento mais. Apenas sigo o baile neste ritmo acelerado, tentando manter a cabeça o mais distante das pressões externas. E esse lado B fala disso, se no começo do mês estava num grau de paz bastante elevado, no meio do mês isso não aconteceu.

Coincidentemente, na terça depois do show, fiquei triste, não sei se foi a nostalgia das lembranças, mas passei boa parte do dia chateada – o que piorou depois de uma reunião no trabalho. Na quarta, meu ex namorado (que não foi nada legal comigo) me procurou, trazendo a tona mágoas que demoraram muito para deixar de doer. Quinta, tive dificuldade de escrever no meu caderninho da gratidão (sim, eu tenho um). Na sexta, a possibilidade de algo que gostaria muito me animou, mas me deu medo de estar criando expectativas. Sábado ouvi que era mal-amada, fui dormi chorando e perguntando por que sou mal-amada.

Domingo me esforcei para melhorar o astral mesmo com uma pontinha de tristeza dessas que a gente não sabe de onde vem. Segunda, fiquei bastante chateada por algo que queria não rolou (o que havia me animado no sábado). Chorei, chorei e chorei até esvaziar. Na terça arrastei minha chateação por aí, inclusive na testa, já que não sei disfarçar nada. Porém, quando voltava da aula de criação literária lembrei que não havia jeito, enchi algumas páginas do meu diário com o mais puro drama e orei para isso ser só tristeza e passar logo.

E já passou. Mas liguei todas as luzes vermelhas, fiquei com medo de ser o começo de um filme que já vi e revi algumas vezes. Fazia tempo que eu não passava por uma sequencia de dias tristes e para quem já teve depressão, tristeza prolongada é sempre um sinal de alerta.  

Extras

Neste momento que escrevo são perto das 8h de domingo, 28 de junho, estou num hotel em Piratini, cidade no sul do estado que foi a primeira capital da Guerra dos Farrapos. Aqui moraram Bento Gonçalves, Garibaldi e Luigi Rossetti (que criou o jornal O Povo), vim para conhecer esse cenário tão importante para a história gaúcha com os meus colegas da oficina de criação literária.

Nos divertimos muito no trajeto, na recepção pelo Secretário de Cultura do município, na guia vestida de Anita, no jantar maravilhoso regado a vinho,  declamações de poesias e música francesa, nos autógrafos que distribuímos (sim, teve isso também). Bebi vinho e cachaça até agora pouco e lembro de tudo (até do Porão Sertanejo), acordei com o barulho de uma porta batendo e peguei o note para revisar o texto. Porém, lembrei que amanhã seria o aniversário da vó Helga. Amanhã eu termino, em homenagem a ela. Agora vou dar uma volta e passar na missa, a turma toda ficou de ir.

A única vez que peguei o texto ontem, me emocionei. Cedo vi meus tios e primas falando da falta que a vó faz, mesmo depois de 20 e poucos anos. Conversei com uma prima sobre o gosto da comida e do perfume que ela usava que às vezes vem nos visitar. De noite, falei com a mãe sobre ela e enchemos os olhos d’água. O pai lembrou que ela adorava uma caipirinha e disse que a vida seria melhor se ela estivesse aqui.

Reviso esse texto agora, durante o trabalho no último dia do mês. No céu, tem Júpiter em conjunção com Vênus, em Leão. Essa é uma configuração astral muito boa, de ampliação, de colheita. Olhando para trás, apesar da tristeza, eu estive exatamente onde queria estar, em todos os momentos. Para o futuro, as três viagens planejadas e já acertadas, me animam. Às vezes, quando peço para ser merecedora do afeto e da coragem de alguém, me dou conta que os nossos desejos não podem nunca nos roubar a presença do momento. Eu só quero estar presente em mim. 

Sunday, May 24, 2015

Retrato falado




Ao som de Já É, do Lulu Santos


Quando acordo cedo para cozinhar no domingo, brinco de ser quem eu não sou nos outros dias da semana. E acordar cedo no único dia que posso dormir é algo que me mostra o quanto todos nos mudamos, o quanto mudei.

Quando me dou conta de onde estou e em quem me tornei, lembro os outros caminhos que inevitavelmente tive que deixar para trás. Embora ainda crie suposições com todos os infindáveis “se” que me restam. Se tivesse feito turismo, se tivesse estudado história, se tivesse assinado o contrato para ser trainee de uma grande empresa, se tivesse ido morar em Santa Maria, se tivesse feito balé e não dança do ventre...

Por mais feliz e realizada que uma pessoa pode ser, viver sempre será abandonar caminhos e possibilidades e imaginar outras vidas com o que se deixou partir. Por isso que a única coisa imperdoável para mim é ficar em cima do mundo. Se a nossa história é só uma gota dentro de um oceano de possibilidades, eu que vá fundo, que mergulhe de cabeça e faça da minha gota o meu mar.

Quando brinco de caça palavras com a minha inspiração sou o mais puro que já fui um dia. Não há passado, nem futuro, embora minhas histórias sirvam para enfeitá-los. Já perdi o medo das sensações que elas me provocam, me permiti aprender que tem que tocar, tem que ser forte e intenso, tem que fazer perder o ar e se espantar.

Quando eu te dou meus versos, perceba a minha alma, por favor. Nem meu sexo e nem o meu gozo são mais íntimos que minha escrita. Nem antigos amores, por mais que me inspirassem mereceram o conhecimento do que escrevo. Qualquer coisa a mais que pretenda te dar, deixarás de ser livre e pouco a pouco verei tudo morrer. A única maneira de sermos perfeitos e nas palavras.

Por mais feliz e realizada que eu pareça, tem dias que a solidão anda de mãos dadas comigo. Guardo tanta coisa comigo que me assusto do meu tamanho. Sempre falei para o meu terapeuta que não tinha muita escolha não, o jeito é viver bem, apesar de. Sou tão “Maria do passo certo” que faço a lição de casa direitinho, estou até parecendo feliz nas fotos.

Wednesday, April 29, 2015

Sunday, April 05, 2015

Dos lados de se gostar



Nem sempre é fácil gostar de você. Tem vezes que dói, irrita e incomoda, tem noites que mais choro do que durmo. Nem sempre afetos bons se comportam como devem. Acredite, tem momentos que eu preferia não sentir. Queria ser pedra. Ser nuvem. Ser nada. Momentos assim são minoria, mas existem.

Sinto falta, vontade, saudade e isso dói. Depende do momento, se for à noite, deixo vir (passa mais rápido), escrevo, choro, escrevo, choro, oro e pego no sono. Se for durante o dia, respiro fundo e me foco em outra coisa, no máximo vem um nó na garganta que aproveito para treinar uma respiração mais consciente e meu autocontrole. Não, eu não vou chorar dentro do metrô, ou agora com tanto trabalho para fazer, ou no meio da corrida, ou durante um exercício do pilates, ou numa mesa de bar dando risada com os amigos... Quase sempre, eu venço.

Me percebo idiota – e quem não é quando gosta? Na vontade de te contar tudo e de perguntar tudo. Você seria um excelente amigo porque sempre gostei de conversar contigo. O problema é que não sinto tesão pelos meus amigos. Precisava ser assim? Inteligente, humano, ter esse olho azul lindo, os cachinhos que sempre vão te dar essa aparência de guri mesmo quando fores um velho recalcado e ainda me dar corda? Sim, talvez você nem perceba, mas me dá corda. Só que isso não significa nada, não há espaço na tua vida para mim e nenhum movimento da tua parte para que possa ter. Quando me dou conta disso, vem a irritação.

E quando começo a imaginar que você, obviamente, deve ter afeto por alguma mulher, que não eu. Monto mil opções na minha cabeça (lembrando que sou supercriativa), então sai de tudo. Loira, ruiva, morena, negra, baixa, magra, alta, gorda, de perto, de longe, amiga de infância, vizinha, conhecida de viagem, ex-professora, paulistana, carioca, baiana, uruguaia, alemã, chilena, estadunidense, cubana, marciana, alguém que você nem conheceu ainda, um amor platônico, distante, impossível, possível, próximo, real. Meu senso de humor tão exageradamente dramático não serve para nada nessas horas. Acho que te faria rir ou talvez até já faça. Deve ter alguma coisa boa para você nesta história. Tenho certeza que na hora que leu “velho recalcado”, sorriu.

 Quando comecei a escrever esse texto estava mais triste que feliz, mas como é necessário pensar e sentir antes de por no papel, a energia mudou. Isso não significa não ter consciência das coisas, mas só perceber que depois de tanta coisa ruim que já aconteceu comigo, o fato de gostar de alguém e não pirar é bom. E não esperar nada em troca é libertador. Dizem que amor é assim, não espera nada. Como aprendi a não curtir esse papo de amor, pois penso que estamos muito aquém disso, falo de afetos. Por não esperar nada em troca e ainda assim me sentir feliz com o que sinto, considero esse afeto bem verdadeiro e saudável. E vem a certeza de que gostar de você é bom, embora nem sempre seja fácil.

Começou a tocar uma música da tua banda preferida no rádio, incrível como as coisas acontecem quando estamos sintonizados com o todo. Fecho os olhos e converso com nossos anjos da guarda.  Para o meu, peço que você venha me ver num sonho. E para o seu, que cuide bem de ti, tão bem quanto acho que eu cuidaria. E que você num ato de descuido, pense em mim.

Thursday, April 02, 2015

A paixão continua

Minha adolescência se deu entre o final de década de 90 e o começo dos anos 2000, no auge das boys bands. E eu que havia resisto bravamente à onda do axé baiano e pagode meloso, sucumbi quando vi Nick Carter dançando e cantando na chuva (mais clichê impossível) no clip de Quit Playing Games With My Heart.


Sim, fui uma Backstreet fã! Tinha todos os CDs, pastas e pastas com fotos e reportagens, camisetas... Não perdia um Disk MTV, gravava tudo que podia em fitas VHS (que ainda existem), me quebrava para colar os pôsteres até no teto do meu quarto, torturava a família, os amigos e os vizinhos com o repertório estrategicamente planejado, de refrões fáceis e pegajosos. Em agosto de 2000, fiz 15 anos e falei para o pai e para a mãe que não queria nada, que era para guardar o dinheiro para o dia que eles viessem ao Brasil. Bom, em maio de 2001 fiz a primeira viagem da minha vida sozinha, peguei um ônibus até São Paulo, para ver o show dos Backstreet Boys, no estacionamento do Anhembi.


Depois disso, aconteceu o óbvio: eles foram perdendo espaço nas paradas de sucesso, eu fui mudando, as fotos saíram das paredes do meu quarto, passei a preferir músicas mais elaboradas, tive outras paixões (nem todas possíveis) por garotos que eu conhecia de verdade, fui em shows melhores e todo o arsenal de fã foi encaixotado e guardado.


Mas não esquecemos nada que fez parte da nossa vida, só a colocamos no departamento das coisas passadas e às vezes, quando escutava sem querer alguma música e sai cantarolando com a mesma segurança de 15 anos atrás ou quando alguém falava neles, meu primo Júnior sempre fala (acho que de toda a família, ele foi o que mais sofreu com a tortura Backstreet), voltava até essas memórias e sorria - estava tudo intacto.


E qual não foi a minha surpresa ao saber que os Backstreet Boys estavam com shows agendados no Brasil para junho desse ano e que Porto Alegre estava na agenda? Numa fração de segundos, pensei “não vou pagar esse mico”, que logo foi substituído por “não perco esse show por nada!” Desde então, tenho observado coisas estranhas, várias amigas confirmando presença no show. Pessoas que eu não falava há anos mandando mensagens do tipo: “vamos no show do BSB, né?”, no metro ouvi um grupo de mulheres discutindo qual era o mais bonito, Nick, Brian, Kevin, AJ ou Howie?


Outro dia, chegando no pilates, escutei uma moça dizendo para a instrutora: “dia 15 de junho não venho, vou num show... Meu namorado nem sonha que vou passar o aniversário dele com o Kevin.” Dia 31 começou a venda de ingresso para o show em Porto Alegre, diversas mulheres posaram em frente à loja, em duas horas se esgotaram vários setores. Infelizmente, só consegui ingresso para a pista normal (queria a VIP), fui comprar no fim da tarde do dia 31, o que foi de fato, tarde. E ainda assim, havia fila, vi uma moça vestida de maneira social (salto fino, saia até o joelho, blazer, meia calça...), parar no meio da loja e beijar o ingresso dela!


Tem uma professora espanhola que está fazendo intercâmbio em Porto Alegre, amiga de uma amiga minha, que mudou a data de retorno para Madrid só para ir ao show. Semana passada uma amiga casada, intelectualizada, mãe de dois filhos postou no face: “vou trair o Taylor Hanson (de outra boy band, porém musicalmente mais evoluído), para ir ver o Brian Littrel.” Em São Paulo e no Rio de Janeiro, os ingressos também se esgotaram no primeiro dia, mas lá foram agendados shows extras.


Eu não era a única com essa paixão adormecida. Estou curtindo muito essa nova onda, é estranho, tanta coisa aconteceu de 2000 para cá. Todas que vão no show usam a desculpa de que é pelos 14, 15 anos, que vão só acompanhar a adolescente que foram e não é de se estranhar se for um choro só neste show (eu mesma, vou levar meus lencinhos).


Essa história toda me fez lembrar que o Nick Carter vai ser sempre meu namorado imaginário, por mais que o tempo passe. Nem sei porque sofri tanto com meu ex. Afinal, meu namorado é perfeito, loiro de olhos azuis, 1,85 de altura (alto, do jeito que eu gosto), de voz aveludada, canta numa banda com os amigos, mora em outro continente (ainda bem que nunca achei distâncias geográficas um empecilho). Agora em junho vem me ver, vai até tocar em Porto Alegre, várias amigas estarão presentes, algumas são afins dos amigos dele.


Vai ser muito divertido, depois voltaremos para casa com a alma leve, como tínhamos quando éramos adolescentes e no outro dia ninguém vai se importar de acordar cedo, se vestir de adulta e ir trabalhar, encarar os amores reais, que deram certo ou não, os filhos, os chefes... Vai ter uma menina, de 13, 14, 15 anos realizada dormindo dentro da gente.


 

Friday, March 20, 2015

Tardio


Era tarde, o relógio mostrava. Mas parecia que falava, que gritava tamanho era o desespero em se dar conta que era tarde.

Caminhou pelas ruas sem direção. Sua mente era tomada por uma enxurrada de ideias, mas não sabia nem qual era a palavra certa naquele momento.

A situação que se metera, ora angustiava, ora causava euforia. E se perguntava “não seria isso a vida?”

Corria para chegar em casa e resolver o que fazer. Havia urgência, mas também medo, já que aumentava o trajeto por ruas onde não costumava passar.


Quando chegou em casa, já estava com um sorriso contente no rosto. Tudo o que estava ali, bastava, só precisava esquecer que era tarde. E foi o que fez.  

**Primeiro texto produzido, no primeiro exercício da primeira aula da Oficina de Criação Literária que estou fazendo.

Friday, February 27, 2015

Terapia do renascimento


Meu nome é Renata, nasci no dia 08 de agosto de 1985, com o sol em Leão (signo do ego) e renasci no dia 08 de fevereiro de 2015 com o sol em aquário (signo do futuro). Meu nome significa “aquela que renasce.”

Algumas semanas atrás, tive a oportunidade de passar pela experiência mais incrível da minha vida. O Rebirthing ou a Terapia do Renascimento é um método holístico que usa as técnicas de respiração denominadas “respiração conectada, respiração circular, respiração consciente, respiração espiritual ou respiração de energia intuitiva”, com o objetivo de potencializar a conexão entre expiração e inspiração.

Esta técnica traz para o corpo e a mente, a purificação pelo ar, pelo prana, a mais pura Energia Divina, limpa o sangue, o sistema nervoso, o estresse acumulado, as emoções e mágoas antigas guardadas em todas as células e, consequentemente, promove a cura para muitos males, de maneira simples e poderosa. Muitos o consideram como o "novo yoga", "yoga da vida eterna" ou "yoga da longevidade".

Dos meus 17 aos 20 anos fiz yoga e na primeira aula, o professor falou sobre isso. Claro que eu não prestei atenção porque não era o momento, não estava preparada. E como as coisas acontecem no tempo certo, isso tudo veio (ou voltou) a tona, agora. Aliás, voltar para a yoga é prioridade no próximo mês, chega de andar distante de mim. 

Voltando ao Rebirthing: a terapia foi descoberta por Leonard Orr de maneira intuitiva, numa banheira de água quente onde buscava simular o útero materno. Durante o banho, sua respiração começou a se alterar e Leonard vivenciou o momento de seu nascimento. Eu passei por isso. Sim, eu renasci e desde então procuro as melhores palavras para descrever as sensações inexplicáveis que tive. E acreditem, pode parecer exagero da minha parte e ainda assim, não chegará nem perto do que realmente foi.

O Rebirthing foi realizado como uma dinâmica num curso que fiz, onde incluía meditação, técnicas de respiração e hipnose. Fui movida pela curiosidade e durante as mais de 40 horas que fiquei isolada num hotel, senti medo, raiva, alegria e fui constantemente surpreendida. Nenhum tipo de estimulante externo (álcool, cigarros e qualquer outro tipo de droga) era permitido e todas as dinâmicas culminaram com o renascimento.

Fiz a viagem mais louca da minha vida, de cara. Meu corpo passou por sensações que eu não tinha consciência que já tinha vivenciado, me dei conta das obviedades que moravam em mim, acordei potencialidades, me senti viva, intensamente viva e tudo consciente. Foi melhor que chá de cogumelo, mais dolorido que tatuagem, mais intenso que orgasmo, me trouxe mais paz que voar de asa-delta.

Passar por essa experiência de reviver os meses no útero e o momento do nascimento é um presente que todo mundo deveria se permitir. Penso que para qualquer pessoa será gratificante, no meu caso, revivi todo o AVC que minha mãe teve quando estava grávida de 3 meses de mim. Senti medo, muito medo, me senti abandonada, não entendia aquele silêncio todo, mas valeu cada minuto.

Me emociono quando lembro, principalmente da sensação muito forte de que antes dos meses que a mãe passou no hospital, eu estava num ambiente muito festivo, de alegria e celebração. Depois do Rebirthing, a mãe me disse que contou para toda a família que estava grávida no natal e que todos estavam muito felizes (ela já tinha perdido um filho, que nasceu morto anos antes). Senti tudo isso! Lembrei também da festa do meu primeiro aniversário. Sério! Eu estava encantada com o sapato branco que estava usando e senti minha mão doer de tanta força que eu fazia segurando o dedo de algum adulto enquanto eu dava uns passos.

Mudei muito depois disso. Mudou a mulher de quase trintas anos. Mudou a mãe que um dia eu posso me tornar e mudou a maneira que eu enxergo qualquer criança, porque tive a chance de adulta sentir o que elas sentem. Infelizmente, a gente vai crescendo e se perdendo, se sentindo cada vez menos, não nos reconhecemos porque vivemos cada vez mais para os outros e menos para si.

Foi necessário fazer a viagem mais maluca da minha vida, para dentro de mim, para me dar conta do óbvio, para encontrar todas essas sensações que já me fizeram vibrar e estavam perdidas em algum canto da mente, da realidade, do medo, do julgamento, dessa correria que nos amortece para os detalhes.

Acredito que só vou ter noção do impacto daqui alguns anos, mas afirmo que renascer sem morrer, nascer novamente enquanto se vive nos dá a certeza e a gana de aproveitar cada momento. A gente percebe todo instante a vida nos dizendo “é bom existir. Permita-se!” 

Monday, January 26, 2015

Para sempre nosso, Caio F.


Ao som de Menino Deus, do Caetano Veloso

Querido Caio,



Assisti sábado o documentário “Para sempre teu, Caio F”, da Paula Dipp e do Candé Salles. Emocionante, como você era lindo menino! Teus amigos deram depoimentos sobre você, a Déa Marques, o Luiz Arthur Nunes, o Luciano Alabarse, essa gente que eu já me sinto íntima, porque li muitas das cartas que vocês trocavam. Falaram da tua obra e da tua pessoa. Lembraram fatos, contaram histórias, elogiaram os textos e se emocionaram. Seus irmãos também falaram, deve ser difícil para eles.

A Regina Duarte fez uma fala linda, disse que muita coisa ela só se deu conta depois de ler você, que pinçou coisas na consciência dela que poderiam passar a vida toda, adormecidas. É isso Caio! Você fez isso comigo também e com tanta gente por aí. Lembra que nossa relação não foi assim, de uma hora para outra. Li Sargento Garcia no colégio e foi muito forte para uma menina de 14 anos. Depois, já na faculdade uma amiga vivia falando bem de você e eu resistia, até o dia que um professor levou Os Sobreviventes como exemplo de texto pós-moderno. Me ganhou, foi um amor à segunda leitura.

Sério Caio, você tão virginiano me trouxe detalhes da vida que eu nunca teria reparado. Me falou de amores falidos e bem sucedidos, me explicou a fossa e a finitude  da vida, me mostrou o lado feio, sujo e sombrio das pessoas, me descreveu o sexo das mais diversas maneiras, me acompanhou quando mergulhei de cabeça no fundo do poço e me deu a mão quando foi necessário voltar para o lado leve do mundo. Tudo através dos teus textos tão crus, verdadeiros, sem firulas, tudo muito simples, mas igualmente intenso. Ensinou que a gente sempre pode tirar um coelho da cartola ou enfeitar até a amargura.

Teve uma vez, eu estava numa estação de trem na Áustria, era madrugada. Com meus 25 anos, fazia uma viagem de mais de dois meses pela Europa e sozinha. Aquele dia estava cansada, há dias eu não conversava com ninguém. Tinha vindo de Munique, descido numa estação de Viena no meio da tarde, almoçado ali mesmo, dado uma volta pelas ruas próximas, pegado um ônibus para essa estação que estava onde pegaria o trem lá pelas 2h48 (lembro que era um horário quebrado e ainda assim, os trens nunca se atrasavam) para Milão.

A estação ficava nos arredores de Viena, no meio do nada, eu fiquei umas quatro horas lá, sozinha, esperando o trem que veio da Rússia. Virou até história, os amigos pedem como foi mesmo a história do tal trem russo... O fato é que comecei a entrar em pânico, eu que sempre lidei bem com a minha solidão, sentia ela arranhar, porque naquele momento, num país estranho, de passagem, com um mochilão nas costas, eu era ninguém Caio, eu era só solidão. Lembrei de uma das suas cartas que você relatou algo parecido quando estava sozinho no interior da Escócia, disse que tinha vontade de se machucar para ter uma dor física que desviasse o foco da dor interna. Eu sentia isso. Ali, eu chorei metros cúbicos enquanto esperava o trem russo, que chegou pontualmente e me levou. Pior que o peso da mochila, só o peso da solidão. Mas você me acompanhava.

Teve outra vez, que eu tava triste, não me lembro o motivo, lia alguma coisa sobre As Frangas, sempre engraçado. Mas eu chorava desesperadamente e pensava que “as frangas eram a válvula de escape do Caio”, a gente tem que criar ilusões e histórias com finais felizes para aguentar essa barra pesadíssima que é a vida.

Me sinto íntima até das tuas frangas. Tenho um amigo que não gosta de você e às vezes isso é tema de discussões intermináveis. Qualquer pessoa que goste de mim, leverá você, o Fito Paez e músicas árabes de brinde. Assim como qualquer pessoa que goste de você, levará as frangas e a Ângela Rô Rô como anexo. Nós e nossas extensões...

Alguém no documentário disse que você era muito gentil, que mandava recados e bilhetinhos para os colegas de trabalho, que não poupava esforços na hora de agradar quem amava, na hora pensei “é o nosso ascendente em libra” que nos torna mais humanos. Meu fogo leonino e sua terra virginiana são espalhados pelo ar da justiça libriana.

Bah Caio, falando dos astros, o mundo anda bem virado. Assim como os seus amigos, me pergunto o que você pensaria se ainda fosse vivo (em 2016 fará 20 anos que você se foi). Ano de Marte esse 2015, já viu né, disputas, guerras, batalhas, tudo a flor da pele, muito excesso, egos em ebulição -  Júpiter está em Leão. Quando será que vamos saber canalizar positivamente a energia do Universo?

A Veja, aquela revista que você trabalhou, é hoje o pior exemplo do jornalismo brasileiro. Jornalistas continuam quando pouco e trabalhando muito. Mas escrever ainda é  libertador. E a internet que você conheceu tão superficialmente, se tornou fundamental, o que você pensaria sobre essa orgia virtual? Temos também as redes sociais, no Facebook  você é rei Caio, o que me deixa ora orgulhosa, ora irritada.

Virou até referência entre teus leitores perguntar se “é fã do Caio antes ou depois do Face?” Há inúmeras páginas sobre você, com milhares de curtidas, frases são repetidas e compartilhadas a exaustão, aquela foto com o Cazuza é ícone. Como fã, fico muito orgulhosa com todo esse teu sucesso. Mais que merecido.

Mas quando vejo uma frase que não é sua atribuída a você, me irrita. Me incomoda também que fiquem só na superficialidade do “que seja doce” – uma das frases mais compartilhadas – tem um mundo por trás disso. As pessoas tem que saber que você foi uma dos maiores escritores existencialistas do Brasil, traduzido para dezenas de países, ganhou os prêmios mais importantes da literatura nacional, foi dramaturgo e colunista de jornal.

É ótimo citarem trechos dos contos mais leves e solares como Que seja doce... ou Zero Grau em Libra, mas tem que conhecerem os outros Carta anônima, Aqueles dois, Para uma avenca partindo – só para citar alguns dos mais conhecidos. Saberem da importância de Os Sobreviventes por causa da maneira frenética que a gente lê devido ao uso que você fez da pontuação. É necessário ler os teus romances Limite Branco e Onde andará Dulce Veiga?

Se apropriarem da tua imensa contribuição para a nossa cultura pop, a criação da expressão “saia justa” , ou da classificação para os gays: Jacira, Telma, Irma e Irene. Acredita que meus amigos homossexuais usam ainda hoje, principalmente a Jacira (Jacííííra) e a Irene? Caio, você ainda é muito presente.

Guri, alguém contou em um determinado momento do documentário, acho que foi a Lygia Fagundes Telles, que você tava chapadão com a Hilda Hilst, na Casa do Sol (apareceu a Figueira, a tua Figueira mágica), e vocês saíram para conversar com os mortos. Rimos muitos no cinema. E a Lygia disse algo do tipo: “loucos, mas cúmplices”. Lembrei de uma noite que eu estava lá na Guarda do Embaú, depois de várias canecas de chá de cogumelo, eu e a Tatá vimos um disco voador no meio do Rio da Madre, ou algo muito parecido com isso, eram várias luzes coloridas, lindo e assustador de se vê. Pouco falo com a Tatá hoje em dia, nem sei se ela continua morando na Palhoça ou se voltou para São Paulo, mas às vezes rola umas mensagens no Face do tipo “e aí, tudo certo, lembra do nosso disco voador?” Acho que é só para ter certeza de que somos cúmplices caso apareça alguma dúvida em relação à loucura.

Sabe Caio, quando começaram a falar sobre a AIDS no documentário fiquei triste, sabia que era o começo do fim, do filme e da vida. Uma coisa que sempre me chamou a atenção foi o teu medo de ter essa doença, seria intuição? Ontem à tarde, estava tomando banho de sol e pensando que eu deveria enfrentar o meu medo de dirigir, facilitaria a vida quando quisesse viajar para algum lugar próximo. Mas tenho medo, sei lá, aí pensei no teu lance com a AIDS, será que o meu pavor de trânsito é intuição de alguma coisa? Que isso ainda vai me levar pessoas que amo (vou ali bater na madeira) ou até mesmo eu?  

Sobre pessoas que se ama, já fiquei com muita raiva daquele teu ex, aquele que é colunista de jornal, já pensei em bater na porta dele e tirar satisfação: “como assim você esnobou o Caio, ele sofreu horrores por ti”... Imagina a cena que uma leonina, com ascendente em libra e Vênus em câncer iria fazer? Mexe com quem amo, para ver!  Até o dia que li uma entrevista dele falando isso, que os teus fã o odeiam, que o perseguem... Claro que ele disse que não foi bem assim, que você era exagerado e uma pessoa difícil de lidar. De qualquer maneira, ele está tendo o que merece. Bem feito!

É isso Caio, muita coisa para te dizer. Se estivesse vivo, encheria a tua caixa postal e de emails. Queria te falar do documentário, que és lindo, que tem uma legião de gente que emana amor quando pensa em você. A Suzana Pires resumiu bem, disse que “só lê Caio quem viver”, a tua obra, por mais niilista, pessimista e até depressiva que seja, é sobre a vida. Para se viver bem tem que transitar por todos os lados. Tem que ter a noção da risada desesperada, doida para ser exteriorizada, no meio da tragédia e da dor, assim como saber da tristeza presente quando estamos inebriados de alegria fugaz.

Não entendo como você, tão espiritualizado, comia carne e como tão intenso, não tinha tatuagens...  Já tenho “que seja doce” tatuado no braço, penso em fazer outra frase, mas estou em dúvida. Gosto de “exigimos o eterno do perecível, loucos", “a única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso” e “chegar ao centro, sem partir-se em mil fragmentos pelo caminho”, qual você prefere?

Outro dia, joguei tarô e saiu tanta carta boa, O Mundo (esse se repetiu em todas as perguntas), O Sol, A Estrela, A Roda da Fortuna. O jogo revelou um futuro bem bonito, acho que tenho que fazer a minha parte agora, embora não saiba exatamente o que fazer... Sou meio tapada para algumas coisas.

Como você já está aí numa dimensão bem melhor que a nossa, não tem como postar essa carta no correio, embora pudesse mandar para os teus irmãos... Posto aqui no blog e sei que o Universo vai levar meu amor e vibração até aí, junto com os meus sinceros desejos que o teu paraíso seja repleto de rosas e girassóis, doces de figo, incensos e conversas com a Ana C, muita luz para ela também.

Quando eu morrer Caio, vou levar os livros para você autografar, quero te encontrar e te abraçar – imagino em qual altura do teu peito a minha cabeça vai bater (você tinha quase 1,90m, né?), espero que eu consiga escutar teu coração. Poderemos conversar sobre astrologia, I Ching, tarô, búzios, runas, lexotan, sincronismo, co-criação  e outras viagens, você me contará das suas rosas, eu vou falar do meu jasmim. Quando morar no meio do mato e ter um jardim, ele se chamará Caio F.

Eu comecei escrevendo essa carta ontem, domingo, já com a ideia de postar hoje por causa da lua que ingressa em touro (estável morada de Vênus) e porque Vênus está nos últimos graus de aquário, seguindo para peixes, um ótimo céu, mais amoroso! Agora revisando, me dei conta que esqueci de relatar que quando terminou o documentário teve gente que só saiu da sala depois que encerrou os créditos, vi duas moças saírem abraçadas e chorando, vi rapazes dando tapinhas nas costas e sorrindo cúmplices, todos saíram tocados. Eu garanto, você foi e é muito amado pelo que escreveu. O Universo te deu exatamente o que você desejava. Axé!!!

Para sempre tua, Re

Saturday, January 24, 2015

Uma velha conhecida (Trilogia da leveza – parte III)


Foi na noite do 1º dia do ano, estava na cobertura de um prédio (9º andar, se não me engano), depois de um dia feliz com pessoas que amo e banho de mar numa praia de Santa Catarina, o fim de tarde tinha rendido cores lindas no céu, tinha aquele ventinho bom de noite na praia, estava tudo bem e eu me sentia em paz. Quando me dei conta da situação e percebi que não pensava em me matar e senti vergonha por todas as vezes que isso parecia ser a única opção. E orgulho por ter chegado até aqui.


De acordo com o diagnóstico do meu terapeuta, tenho distimia obsessiva, um tipo crônico de depressão, porém menos "grave", onde os sintomas depressivos podem durar um longo período, muitas vezes, dois anos ou mais. Só no Brasil existem de cinco a 11 milhões de indivíduos com a doença, em geral essas pessoas possuem um sentimento geral de inadequação e são excessivamente críticas.


Garanto, não fácil tocar a vida com um diagnóstico desse, mas é totalmente possível ser leve e até feliz apesar dele. Desde a adolescência eu faço terapia, sempre procurei entender o porquê do vazio. Já passei por vários psicólogos, por remédios – de Lítio a Fluoxetina, terapias alternativas – florais, reiki, meditação, acumpultura... Já ouvi que tudo isso é frescura.


Atualmente sigo só com a terapia psiquiátrica e nunca lidei tão bem com tudo isso, acho que é a experiência. Distimia, depressão, bipolaridade, borderline são doenças como diabetes, asma, tuberculose e precisam ser tratadas. Não tem nada de frescura nisso!


Hoje por exemplo, estou meio triste, mas é só tristeza - não estou subestimando esse sentimento, sei muito bem o estrago que faz - mas sei que neste momento é só isso, tristeza, pois algo que queria parece que não vai rolar. Coisas da vida... Não me sinto vazia, quando eu me encho de vazio, o sinal vermelho acende. Sei que isso pode e provavelmente irá acontecer em outros momentos da minha vida. Terei outras crises, mas penso que por ser reincidente, já coloquei uma cama elástica lá no final do meu abismo e por mais cheia de falta de sentido que eu volte a ficar, se a queda não for amortecida, ao menos não terá aquele desconforto de primeira vez. Conhecimento trás segurança e intimidade até com coisas não tão boas.


Esses anos todos em volta disso ampliaram muito minha consciência. Não me orgulho de escrever que houve momentos que eu não chegaria nem perto de uma sacada com medo de não resistir e me jogar e acabar com tudo, mas também não me envergonho. Tenho consciência disso e que tenho que lidar com os meus demônios. Mas tenho certeza de que esse assunto tem que deixar de ser tabu!


Por sorte ou mecanismos inconscientes de defesas, sempre tive coisas para me agarrar, para justificar minha permanência aqui. É questão de honra para mim me preencher o meu vazio com coisas que gosto, posso me sentir vazia mas oca, não sou. Rousseau diz que a “felicidade é um estado simples e permanente em que a alma basta a si mesmo.” Bingo!


Quando comecei a Trilogia da Leveza falando sobre autoconhecimento é porque isso foi fundamental para a Renata entender a Renata. Se me sinto leve, se penso que minha alma me basta foi porque um dia nada me bastava. 2015 começou muito bem, com energias boas, calmaria, família, perfume e risada de bebê, esperança, sossego, diria até que foi um começo bem feliz, melhor despedida para o Saturno não poderia ter. Fiz a lição de casa me sinto grata por isso. Ainda dá tempo de ter desejos de ano novo? Desejo cada vez mais ouvir a minha alma e não o meu ego.


Friday, January 16, 2015

A arte de ser leve (Trilogia da leveza – parte II)


"Meu reino terrestre por um par de asas" - Roseana Murray



Uma querida amiga me deu no natal o livro “A arte de ser leve”, da jornalista Leila Ferreira. Lançado em 2010, a obra reúne histórias e impressões da autora sobre o conceito de leveza, que vão sendo aos poucos tiradas do cotidiano, da memória, das entrevistas acumuladas em sua carreira com pessoas importantes e dos bate-papos com anônimos. Mas também apresenta dados oficiais e interessantes obtidos em pesquisas recentes da psicologia, da sociologia e da medicina.

Claro que achei o máximo ganhar esse livro neste momento da minha vida e foi a primeira leitura do ano. A autora viajou o mundo para conversar com as pessoas sobre o assunto, aliás, as viagens são apontadas como fator de leveza. Assim como o silêncio, ter tempo para si, cultivar hobbies saudáveis, vínculos com pessoas que nos são caras e tantas outras coisas que já sabemos, lemos por aí, assistimos em qualquer matéria sobre bem estar e qualidade de vida.

Porém, não percebi no "A arte de ser leve" aquela pretensão dos livros de autoajuda, como se fosse um manual de instruções que ensinasse a viver. Bem pelo contrário, a escritora sempre ressalta como é difícil a busca pela tal leveza e afirma que está muito longe disso. Mas o melhor de tudo, é que fica claro que viver de forma mais leve é uma escolha e exige disciplina e força de vontade.

Compartilho com a Leila, a ideia de que a leveza não é felicidade, mas é um degrau bem próximo e que talvez, um ser humano leve é mais completo que um ser humano que se considera feliz. Num dos capítulos, há uma entrevista com o filósofo Janine Ribeiro, que alerta para a confusão entre prazer e felicidade, pois o prazer é se dá nos instantes (nascem e se esgotam ali), e buscamos em especial os prazeres que tem na paixão.

O filósofo define paixão como um estado de engano, causado muitas vezes pela euforia, que nos torna passivos diante da vida. Reproduzo a conclusão dele: "a felicidade é mais modesta. Faz parte dela o aprendizado, a renúncia, a capacidade de converter a decepção em algo positivo. Em outras palavras, só é feliz quem souber reciclar suas tristezas. Frustrações são importante matéria prima para a felicidade”. Mais do que nunca, penso que o caminho do meio é a leveza.

Conforme avançava nas páginas, me dava conta de que é possível ter esperança na raça humana com tanta gente leve e de bem por aí. E me chamava atenção o fato da escritora não ter falado em depressão, até que ela tocou no assunto, nos últimos capítulos quando relata o motivo que a levou a escrever o livro.

Leila conta que tem depressão há mais de 20 anos, que já se considerada casada com a fluoxetina e acredita que ainda assim pode ser leve. Mais um ponto para ela, não é fácil assumir que tem depressão, bipolaridade ou distimia, e conseguir escrever com a devida distância sobre um assunto teoricamente oposto, sem ser influenciada pela doença que tem. Mas depressão é assunto para o outro texto...

Por enquanto, só a ideia (sem certezas) de que leveza já está de bom tamanho.

Friday, January 09, 2015

Encontro com Saturno (Trilogia da leveza – parte I)


“Até onde podemos discernir, o único propósito da existência humana 
é acender uma luz na escuridão do mero ser” - Carl Jung

Em 2015 completo 30 anos e no primeiro trimestre, encerra o meu retorno de Saturno (período da vida - por volta dos 28, 29 anos-  que o planeta Saturno volta para a posição exata que está no mapa natal). No meu caso, na casa 1 - a casa do "eu", da identidade, da personalidade. Saturno permanece mais de dois anos em cada casa astral, por isso, leva quase 30 anos para completar o ciclo.

Por essa época, é normal mudanças e reviravoltas na vida. É Saturno nos cobrando o que temos feito até agora, é a colheita justa do que plantamos. Conheço pessoas que mudaram de emprego, casaram, engravidaram, viram relacionamentos longos chegar ao fim, a carreira tomar outros rumos, tudo nestes 28 e 29 anos.

Por gostar e ler muito sobre astrologia, não considero o famoso retorno de Saturno ruim, como muitos acreditam. É uma chance de conscientização, pois se há rupturas e desconstruções, é justamente para deixar conosco apenas o que vale a pena. Saturno não brinca em serviço, não permite empurrarmos a vida com a barriga.

A palavra que melhor define este trânsito astral para mim é amadurecimento, não só pelos fatores externos, mas porque entendi a necessidade que eu tenho de olhar para mim. Acredito, hoje, que o meu caminho sempre será melhor trilhado pelo autoconhecimento. É o conhecimento sobre si que possibilita que o indivíduo lide melhor com a transitoriedade das situações. Pode não ser fácil, mas é atráves desse autoconhecimento que buscamos meios de sanar os “estragos” e recomeçar tudo de novo de maneira mais madura e por isso, diferente.

No segundo semestre de 2013, a minha colega saiu do serviço, o que me fez tocar toda a assessoria de comunicação sozinha (se as coisas já eram puxadas para duas jornalistas...), tive uma Trombose Venosa na perna (o que me obrigou a parar, literalmente) e logo no começo de 2014, levei um pé na bunda homérico enquanto olhava os classificados em busca do apartamento para morarmos juntos.

Eu andava alucinada, com mil coisas para fazer, me cobrando, trabalhando até tarde, começava coisas e não terminava, irritada e sempre no piloto automático. Tinhas dias que a correria era tanta que quando entrava no metro e era obrigada a permanecer 40 minutos sem fazer nada, sentia tipo de um "choque", com o coração a mil, o sangue correndo, o corpo todo agitado e a cabeça entrando em parafuso. Todas as coisas que aconteceram, me obrigaram a rever o rumo que estava tomando.

Porém, mudar meu ritmo não era uma opção. Ter coisas para fazer, dois empregos e hobbies nunca foram um problema, me dão prazer. Porém chegou num ponto que eu não aguentava mais, não pela quantidade de coisas mas pela qualidade da minha dedicação, que estava precária. Não me focava mais, não vivia o presente. Trabalhava pensando no pilates, fazia pilates repassando na cabeça todo o serviço que tinha levado para casa, ficava até de madrugada fazendo coisas do serviço pensando na correria que seria o dia seguinte, tudo isso planejando a mudança e a vida em outra cidade.

Então a única escolha era mudar a maneira que lido com as coisas. É difícil, muito difícil, estou só no começo... Mas me percebo menos ansiosa, não levo mais trabalho para casa quase todos os dias (só quando não tem jeito mesmo), me cobro menos, passei a me dedicar com mais intensidade as coisas que gosto e voltei a sentir. Retomei com seriedade os estudos na Casa Espírita, estou levando muito a sério a minha terapia (coisa que já havia se tornado burocrática). Não empurro mais a vida com a barriga.

Se é para fazer, quero sentir tudo o que eu tenho direito. Se estou caminhando, foco nisso; no trabalho é a mesma coisa; pilates e dança, idem e os happies com as amigas, nem se fala. Quem olha de fora, não nota diferença, as coisas ao meu redor podem estar caóticas, mas foi uma baita mudança interna que me possibilitou aproveitar mais as coisas. Preciso ter (ou ao menos, tentar ter) consciência de tudo, porque é isso que dá sentido para a vida.


Essa busca por mim foi Saturno (justamente na Casa 1), me cobrando, me mostrando o que necessita ser olhado com mais carinho. Estava trilhando um caminho, que achava ser o melhor, Saturno foi lá, me arrancou, colocou nos eixos e me trouxe para o caminho certo. Como disse o querido Caio F. numa carta à Hilda Hilst: “mudei muito, e não preciso que acreditem na minha mudança para que eu tenha mudado. Essa modificação vinha se processando sem que eu mesmo percebesse e, com determinadas leituras e determinadas vivências, ela se consumou.”

Trilogia da leveza


Hoje é dia 9 de janeiro e passei a semana trabalhando num texto sobre o retorno de Saturno. Na segunda fiz um cronograma de assuntos que tenho que escrever para o blog – naquela lógica de levar o Mosaico e as minhas vontades mais a sério, de mostrar o que escrevo (e não são notícias), sem ter medo das críticas.

Durante a semana, enquanto escrevia o texto sobre Saturno, me policiei para não falar de depressão e hoje, terminei a leitura de um livro que aborda a importância da leveza na nossa vida. Pensei que precisava escrever sobre isso também e que no fundo os três assuntos se complementam. Colocar tudo num texto só, ficaria imenso, intenso e tenso demais.

Então, serão três textos para compor a trilogia da leveza: sobre o retorno de Saturno, leveza e depressão – que publicarei a partir de hoje e espero encerrar em uma semana. Ficam na lista de espera os assuntos que estão no meu roteiro, um texto sobre o San (o filho dos meus primos queridos, que é o bebê mais lindo e amado que eu já conheci) e sobre um encontro com uma amiga que mora há dois anos na Austrália.

Isso, por enquanto, pois como a vida é dinâmica tem tudo que ela ainda vai me mandar.


Feliz 2015