O texto abaixo não é meu. E da Tati Bernardi. Uma publicitária e escritora paulista que eu adoro. Como achei esse texto incrível, tomei a liberdade de reproduzir no meu blog.
Foi andando na praia que eu me apaixonei por ela. Saiu esbravejando de dentro de uma casa e no minuto depois estava se derretendo por um desses bebezinhos pelados que ficam pulando quando vêem uma onda.
Eu pensei: “Quem em sã consciência arma a maior encrenca com os amigos e segundos depois é capaz de uma doçura que chega a ser até meio boba?”. Ela deveria ser especial, dessas mulheres difíceis de amar e impossíveis de não amar.
Corri para andar ao seu lado e vi que no mesmo iPod ela tinha Beethoven e Bonde do Rolê. E tinha também Vinicius de Moraes e Gui Borato. E tinha Madeleine Peyroux e Miss Kittin. Não sei, mas pensei: “Nenhum dia ao lado dela deve ser chato. Ainda que ela deva sofrer um pouco com seus pêndulos de humor, gosto e trilha”.
Pelo jeito como ela olhava para as pessoas, eu via a arrogância menos perigosa do mundo. Aquele tipo de olhar que pode te matar, mas, caso você resolva retribuir com um abraço, pode dar a própria vida por um pouco de amor.
Seus passos duros eram de uma mulher decidida, mas também de uma mulher com medo de amolecer a postura e trazer à tona alguns defeitos do corpo. Uma mulher tão comum e ao mesmo tempo tão mais mulher que aquelas outras mulheres com seus banais desejos praianos e acompanhadas de seus banais amigos com desejos praianos. Ela passava pelas pessoas e era como se estremecesse todas as idéias que precisam ser leves por causa do sol forte.
E eu só conseguia ter o ímpeto de gostar cada vez mais dessa mulher. Gostar do seu biquíni do verão passado porque o da moda estava molhado. Gostar que ela falou para os amigos, antes de sair para caminhar na praia, que estava cansada de buscar gente bacana e de verdade. E todo mundo riu dela. E ela se sentiu sozinha feito um urso polar hibernando. E o sol era de 40 graus.
E ela estava arrependida, afinal, eram férias e ela não deveria ter brigado novamente com o mundo. Por que não deixar o mundo ser como era e fim de papo? E aceitar que ela era mesmo meio esquisita e que, fora raros momentos em que os outros ficavam mais loucos ou ela mais normal, ela se sentiria sozinha mesmo. E pronto.
Aí o sol foi baixando, baixando, baixando. E sua guarda seguiu com a vida. E ela foi aceitando todas as pessoas. O sorveteiro mala que buzinava, a babá de cara amarrada, a garota malhada demais, o pai de família olhando pra trás pra ver sua bunda. E foi gostando de cada um de seus amigos, por mais que eles, muitas vezes, falassem alto demais, fossem pães-duros demais, gostassem de vê-la se dando mal, fossem egoístas demais, dormissem demais. Eles não eram perfeitos, mas quem disse que ela era?
E ela foi gostando de tudo, até de mim, que não sou muito fácil de gostar. Quando olhou seu rosto refletido no mar, me deu até um sorriso.
No comments:
Post a Comment