Eu nunca paro na frente do computador e me pergunto o que escrever. Eu sempre sei, sempre tenho inspiração e piração, na medida certa. Cazuza já dizia que “entre o certo e o errado há o resto todo”. Acho que é neste resto que se esconde a inspiração. A piração seria o errado. O resultado de tudo, tentar ganhar a vida escrevendo, é certo.
Eu sou um mar de tranqüilidade. Calma, serena... Nada me faz perder minha posse de Esfinge e meu ar blasé. Nem trem lotado, nem chefe mal-humorado, nem professor recalcado, nem criança mal-educada. Eu nem escrevo palavrão nos meus textos. Meu estômago não dói, ele é pleno. Cheio dessa felicidade medíocre que faz as pessoas se conformarem.
Eu quero ter uma carreira bem sucedida como repórter da Caras ou da Quem. Imagina se eu vou preferir passar dias sem tomar banho só para cobrir uma guerra em algum país remoto. É bem mais fácil, escrever sobre o papel higiênico que as pessoas que aparecem na TV usam. Mas se não der certo, minha segunda opção é ser apresentadora de programa, desses do meio da tarde, que exploram a desgraça humana e tentam fazer caridade. Afinal, já que é impossível resolver os problemas do mundo, ao menos eu consolo os cornos, as candidatas a celebridades, as mães de filhos rebeldes, a mulher reprimida, a abandonada na porta da igreja, o endividado...
Eu quero me casar na igreja-de-véu-e-grinalda, com um homem que além de pau duro, terá coração mole e nunca vai questionar como vai o meu cartão de crédito, que obviamente, ele pagará. Irei morar numa casa com jardim, terei três filhos lindos que serão o orgulho da mamãe. E serei feliz para sempre com essa vidinha medíocre que faz as pessoas se conformarem.
Eu não quero grandes viagens para países distantes. Nem mestrado e doutorado. Nem ter tempo para ir na academia todo dia e ler toda a Comédia Humana. Questionar? Nem pensar. Deixar as coisas como estão, já está ótimo. Que eu nunca perca a gloriosa qualidade de ser prática, de não criar problemas e nem aumentá-los.
Eu quero que meus devaneios durem apenas o tempo de digitar um texto, quando eu parar na frente do computador e não saber o que escrever. E que ao constatar que todos os parágrafos começaram na primeira pessoa, eu tenha a grandeza de acreditar em coincidência, até porque eu não tenho o ego-orgulhoso-e-egoísta-dos-leoninos. Até porque, o que não é inspiração e piração, é devaneio.
2 comments:
Você é incrível!!
Renata...sério????????
Eu não consigo te imaginar fútil.
Como assim não escreve palavrão?!?!
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