José e João cresceram juntos. Tem
o mesmo sobrenome, Silva, quando crianças moravam na mesma rua numa cidade do
interior. Dividiram brincadeiras, merendas, xingões de professores, descobertas
e inquietações da adolescência, conquistas amorosas, porres e festas.
Decidiram juntos ter a mesma
profissão e foram cursar jornalismo na capital, onde dividiram um quarto numa
pensão, mesas de bar, rodas de violão e mais conquistas amorosas. Juntaram
grana para a festa de formatura e planejaram uma carreira brilhante. José é
João nunca brigaram, nem por um ser gremista e o outro, colorado. Até que o
jornalismo dividiu o caminho dos amigos.
Os dois se tornaram referência na
área, seguiram estudando e hoje dão aulas em grandes faculdades do Brasil. José
fez carreira nos principais veículos de comunicação da mídia tradicional.
Escreveu para os maiores jornalões do país, foi correspondente internacional e
fez doutorado em marketing nos
Estados Unidos. Aprendeu a ver a notícia como um produto. Dizem que cobra caro
para dar palestras em universidades privadas ou para empresários que gostam de
ouvir como a mídia é subserviente.
Desde a faculdade, João trabalhou
com os meios alternativos. Fez carreira escrevendo para ONGs, sindicatos,
movimentos sociais e pastorais de igrejas. Implantou a Rede Brasil de
Comunicação Popular que engloba programas em rádios comunitárias, uma revista e
um jornal que devido aos poucos recursos financeiros não tem a tiragem que
gostaria, mas investe pesado no portal de notícias da internet. João é dono do
blog mais lido do país e fez doutorado em Sociologia da Comunicação, na França.
Aprendeu a reconhecer o que há oculto em cada notícia. Quando dá palestras para
o seu povo, fala sobre uma comunicação livre, poderosa e revolucionária. Dizem
que cobra apenas a passagem.
João percorre o país defendendo a
democratização da mídia, o fim dos monopólios e a criação de um conselho
nacional de comunicação. José, quando indagado sobre o assunto é taxativo: isso
é censura! Seguidamente, eles trocam farpas públicas sobre as ideias que
defendem. Outro dia, o grande grupo para qual José trabalha, demitiu dezenas de
colegas e coube a ele dar explicações para a turma do sindicato, liderados por
João, que protestava em frente ao prédio.
Quando eles se encontram em algum
evento social não se olham, não se cumprimentam e não se conhecem. Todos pensam
que são inimigos, mas nos momentos em que cada um relembra sua trajetória e
recordam com saudade os meninos que foram, se perguntam em que momento o amigo,
tão inteligente, se perdeu.
Conto publicado no livro "Caminhos da imprensa Rio-Grandense"
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