Sem jeito, o jovem com uma pasta entra na sede do Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC. Encara a secretária e pede para falar com o seu Henrique,
é o estudante que precisa entrevistá-lo, indicação do Luiz Inácio. A moça sorri
da formalidade forçada e fala alto, quase gritando: Henfil, o Caio chegou.
Logo um moreno, barbudo, de sandálias, calça jeans e camiseta vermelha
lhe estende a mão. Vamos conversar no bar da esquina, o sindicato fecha daqui a
pouco. Ah, pode me chamar de Henfil, diz ao jovem. Já sentados numa mesa na
calçada, Caio começa a entrevista, explica que é para um trabalho da faculdade
sobre o chamado novo sindicalismo.
Henfil explica o trabalho da Oboré,
uma cooperativa de profissionais da comunicação que prestam serviços para
sindicatos. É uma tentativa de ser um contraponto aos grandes meios de
comunicação que não dialogam com os trabalhadores e por outro lado, de fazerem
materiais sindicais mais atrativos, que cativem a base.
Somos a retaguarda dos
movimentos sociais. Temos que ir lá, meter a mão, ajudar naquilo que pudermos,
mas sempre na retaguarda. Nós não somos a vanguarda; os trabalhadores é que são,
disse ao estudante.
Caio soube também que Henfil e Luiz Inácio ainda não conhecem
pessoalmente, mas ele sabe que Lula o acompanha desde o Pasquim, que o pessoal da Oboré
estão trabalhando numa cartilha para o 3º Congresso dos Trabalhadores nas
Indústrias Metalúrgicas de São Bernardo e Diadema. A expectativa de todos é que
a atividade seja um marco para o movimento sindical.
Durante as três horas de conversa e muitas garrafas de cervejas, ficou
claro para o estudante que Henfil era um idealista, um Dom Quixote armado de
lápis, papel e senso de humor. Quem não entendeu muito foi o cartunista. Por
que justo ele foi o indicado para aquela entrevista meio sem pé nem cabeça,
sobre o movimento sindical, mas que falaram mais sobre os cartuns do que
qualquer outra coisa.
Caio é estudante de Ciências Sociais e nas horas vagas desenha, sonha em
viver de sua arte. Vai embora meio bêbado e orgulhoso da conversa com um dos
maiores cartunistas do Brasil. Na pasta leva os próprios desenhos, não teve
coragem de mostrar para o Henfil, mas tem certeza do futuro que vai traçar.